terça-feira, 31 de março de 2020

segunda-feira, 30 de março de 2020

Caminho de perdão




[Secção pensamentos soltos sobre pedras] “Quem não tiver pecados que atire a primeira pedra”. É das afirmações de Jesus mais conhecidas. Não sei se das repetidas, mas das mais conhecidas, sem dúvida. Sempre que este texto é proposto, em retiros ou na liturgia, como hoje, apanho pedras. Sim, no plural. Pedras que gostaria de atirar a alguém. Hoje não foi diferente. 

As pedras ganham nomes. As memórias feridas, por algo que me fizeram, pelos meus julgamentos precipitados, pelo meu orgulho de me achar detentor de razão, pela minha pequenez ou falta de coragem de falar ou calar nos tempos certos, latejam diante do olhar de Jesus no momento em que contemplo esta cena. Às vezes de forma calma, outras, em velocidade vertiginosa, os acontecimentos avivam-se novamente e pergunto-me, perguntando-Lhe, como viver o perdão. É difícil e exigente. Tal como estes tempos o estão a ser. A resposta ecoa no silêncio: reconhecer que o caminho de perdoar e ser perdoado não é um automatismo ou heroísmo, pois é preciso perceber o lado justo e responsável das coisas, em conjunto com o que verdadeiramente é importante no processo de liberdade. E, apesar de ainda não conseguir, quero dar passos em fazê-lo com aquele olhar sereno pleno de ensinamento de nenhuma condenação, levando a que todos aqueles (todos nós?), do mais velho ao mais novo, saíssem. 

Apesar de terem nomes, repito o mesmo no final de cada oração: deixo-as cair. Ao mesmo tempo, com consciência dos muitos passos ainda a dar na liberdade, peço ajuda a Jesus para ser capaz de tirar totalmente as pedras do meu coração. 


[Partilho também as pistas de de oração, em audio de 2 minutos e algo, que propus para hoje nos Apontamentos de Fé no Ponto SJ]





domingo, 29 de março de 2020

Regra de Ouro




[Secção pensamentos soltos sobre as emoções] Jesus comoveu-se e chorou com a morte do amigo. Não me parece que tivesse falta de fé na vida. Simplesmente deixava-se atravessar pelas emoções. É natural sentir dor, angústia, tristeza, raiva, ira, ódio, tristeza, medo, em especial em tempos de adversidade. A questão é saber lidar com isso. A normalidade vem com a educação não apenas intelectual, mas emocional.

Somos muito mais educados no intelecto do que na emoção. Por isso, para muitos de nós é impensável que ainda possa haver gente a sair de casa como se nada fosse ou, em cúmulo, seguir de viagem para outras paragens a aproveitar as férias de Páscoa como sempre assim foi. No entanto, sim, há pessoas alheadas da realidade, até com altos cargos, numa impassibilidade que as leva a viver como sempre foi. Estes últimos consideram que tudo é conversa da treta, até eventualmente serem expostos a uma brutal carga emocional (em extremo a morte de alguém próximo que até foi contagiada por si, que é assintomático). Outros, carregados pelo medo, com frustração, cansaço, arremessam a agressividade pelas palavras (e provavelmente com os gestos, caso os apanhassem a jeito). Devo dizer que me situo num misto de luz, agradecido pelas muitas pessoas que estão a tanto custo em casa, e de sombra, triste por aqueles que ainda não perceberam a gravidade destes tempos novos e da repercussão das suas decisões desligadas de sentido do outro.


Dói-me, sim, ainda mais quando são expostas em perigo as pessoas dos meus queridos Alentejo e Algarve, mas não me adianta entrar em fúrias, nem sequer me alegro se forem contagiados devido à irresponsabilidade dos actos. Por um lado, registo para que se perceba com objectividade o tanto que ainda há a fazer, mais que da compreensão intelectual, na compreensão emocional, promovendo o sentido de respeito e cuidado pelo outro. Por outro, peço a Jesus que me ajude a ser como Ele, emocionalmente sábio, e à abertura de consciência de todas as pessoas para a exigente regra de ouro transversal a todas as culturas: faz aos outros o que gostarias que te fizessem. Afinal, estamos todos muito mais ligados do que imaginamos.

sexta-feira, 27 de março de 2020

Breve oração








Imagens: três momentos em que senti profunda comoção.

[Breve oração ainda em ecos da de “Urbi et Orbi” com o Papa Francisco]

Agradeço-Te 
o silêncio dos passos e o olhar atravessado de luz,
em bênção ao infinito de rostos.

Peço-Te
ajuda-nos a sempre recordar:

“ninguém se salva sozinho”.

quinta-feira, 26 de março de 2020

Tempo de amar




[Secção pensamentos soltos no 8.º dia de Emergência Nacional]

Eram 17h26. O sol batia-me na cara. Fechei os olhos e fiquei em breves segundos a saborear o calor primaveril. Nesses instantes o tempo parou, ou as perguntas que me assolam o coração pararam e deixei-me estar a deleitar o sol. Que estranho é o tempo das coisas. Ou a estranheza de nós mesmos. Isto de pensamento cultural é mesmo vasto. Para uns a desgraça. Para outros a graça. Ainda há alguns no sufoco do absoluto do tudo ou do nada. Vem a colaboração. Vem o escárnio. Vêm os julgamentos e acusações. Vem a verdade dos acontecimentos. Vem a mentira política. Vêm os silêncios e as gargalhadas. 

Todos somos atravessados pela sombra. Não a vou moralizar, apenas constatar a existência. É extremamente fácil apontar dedos. Até com razão de ser. No entanto, o mais difícil, também pela exigência, é tomar consciência da sombra própria, percebendo se esse apontar de dedos resulta de factos ou de idealizações. As crises são alturas muito propícias para despertar a sombra individual e colectiva. Esta pandemia mostra-nos, apesar de tudo nada de novo, que todos somos igualmente frágeis e susceptíveis. Por isso, aprender a conhecer as emoções próprias e perceber onde reside o exagero é caminho para saber por onde a sombra entra. Não nos enganemos, se não se está consciente, o desespero vai começar a despontar. Por isso, se antes não deveria ser, muito menos agora: há que estar muito atento aos julgamentos demasiado rápidos, tanto de si próprio, como dos outros.

Repito, não se pode moralizar a sombra, pois quando temos consciência da sua existência e a vamos trabalhando, ela torna-se uma aliada de humanização e de amor. Aquilo que não se gosta em si próprio, pode-se perceber de onde vem e ao curar a ferida torna-se porta de compreensão. Pode surgir a pergunta: será o tempo propício? É sempre tempo para amar. Isso não significa que seja de um dia para o outro, apenas há que continuar ou, de uma vez por todas, começar. 


quarta-feira, 25 de março de 2020

terça-feira, 24 de março de 2020

Mancha Verde



[Secção coisas de nada] Acho sempre piada às fotografias “sem querer”. Esta mancha de verde fez-me pensar na agitação emocional e na esperança. Se atendermos à mancha, a agitação pode ser sinal do muito que passa por tantos corações, aqui e pelo mundo fora. Desde a quietude à ansiedade, as faltas de paciências e os desejos de saída, passando pelas muitas perguntas do medo, as emoções afloram. É isso: sejam. É fundamental olhar para cada uma delas sem julgamentos prévios. É tudo muito novo. Não adianta conclusões precipitadas, apenas tomar consciência que a força e a fragilidade andam de mãos dadas. E isso é tão humano. A esperança reveste-se na possibilidade de saber que, apesar de se estar fechado em casa a lidar com as emoções, somos muitos a redescobrir a vida. 

domingo, 22 de março de 2020

Sinos a tocar Páscoa



[Secção pensamentos soltos no 3.º dia de Emergência Nacional, depois de ver fotografias de pessoas a passear amontoadas como se nada estivesse a acontecer no Mundo, nem tivessem já morrido dezenas de milhares de pessoas e outras milhares estivessem a fazer os impossíveis nos hospitais] Da minha janela de onde tenho visto o silêncio nos últimos dias escuto o trovejar. Aproxima-se o grito do céu. A chuva junta-se às minhas lágrimas na oração. Sim, como padre também choro. São muitos sinos a dobrar pela humanidade, por mortos que não são números, não podem ser, nunca poderão sê-lo, mas de rostos que ficaram por abraçar. Choro por quem não tem quem chore por eles, jogados em valas comuns. Choro com quem chora à distância, na tristeza de não realizar qualquer cerimónia de adeus. É duro. Muito duro. Os números amontoam-se, os nomes identificam e ao som de tempestade falam-nos de nova existência, de novo modo de viver: ficar em casa, apenas saindo por um bem maior e comum. 

Talvez já se vomite esta expressão. Vamo-la embelezando na tentativa de iluminar tempos sombrios. E bem, sim. Em especial para as crianças. Mas, nós adultos, temos de nos rodear de sensatez e realidade. Apesar da transformação a acontecer, os tempos não são de brincadeiras. Por todo o significado a dar à liberdade, não quero mais amontoados números que justifiquem continuar em estado de guerra. Cada um de nós é soldado a decidir ficar, por mais que custe, por maior a exigência, em casa. 


Há medo. Há angústia. Há saudade. Há dor. Há possibilidade de cada pessoa começar a pensar verdadeira e profundamente em si e nos outros. Despontam muita perguntas de existência, sobre o presente e sobre o futuro. A fé ajuda-me a serenar o coração desde a confiança em Deus que nos quer adultos. Ser adulto na fé é saber atravessar as trevas pelo nosso pé com a responsabilidade pedida, na liberdade que todos queremos. É tempo de trevas e… duras. Cabe-nos a nós ser luz, sem enganos e falsas fezadas, sem desvalorizar a morte, tendo gestos concretos, responsáveis e adultos, contribuindo para que os sinos toquem a celebrar Páscoa.

sexta-feira, 20 de março de 2020

Despontar da quietude




[Secção outros tons em começo de Primavera a anteceder o dia mundial da poesia]

A quietude desponta serenamente. Acalma o suspiro da espera. Todos os afazeres relativizam-se, dando espaço ao tempo maior de contemplar. O que é importante? Gritos de chuva rápida. Sussurros de gotas suspensas. Conversas de novo amanhecer. Os dias parados exteriormente, agitam-se interiormente com muitas perguntas. Respostas? O jarro acolhe serenamente o despertar da quietude e o brotar da esperança em harmonia renovada. 

quinta-feira, 19 de março de 2020

Primeiro dia de Emergência Nacional



[Secção pensamentos soltos no primeiro dia de emergência nacional] Acordei como em cada dia. Quando abri a janela, o silêncio era outro. Em cada dia de abertura de janela os silêncios têm sido outros. O de hoje foi mesmo diferente. Fiquei um pouco parado a contemplar o horizonte, senti a força do significado de algo novo. Falou-se de guerra. Fala-se de guerra. O inimigo é invisível. Não há bombas aqui e ali. Há agitação nos hospitais e no coração de milhares de pessoas. Rezei um pouco, também a preparar a Missa de S. José. A emergência nacional começou em dia de S. José. Emocionei-me enquanto rezava. Não por medo ou tristeza, mas pelo imenso, real e simbólico, que estamos a viver. Atrevo-me a dizer que é um grande parto. Memes, piadas, em vídeos ou fotos, surgem para desanuviar e bem. Seja como for, estamos a viver tempo novo: pessoal e global. 

Tocou-me a mim presidir. Fui buscar uma casula mais forte. Queria sentir nos ombros o bom peso do povo por quem rezo. Cada pessoa de A a Z, com especial destaque por todos os Pais, pelos sem-abrigo, pelos refugiados, pelos doentes e familiares, por todos os profissionais da “linha da frente” e por todos os governantes. Este tempo novo apela-nos à descoberta de maior interioridade, de perceber o quanto estamos ligados para lá de qualquer diferença, de reconhecer a força da união na fragilidade, porque todos somos humanos. Também na escuta das sombras, pessoais e colectivas (vou deixar este importante tema para outro texto). A leituras, as mesmas de cada celebração de S. José, ganharam nova luz.

S. Paulo diz-nos que “Esperando contra toda a esperança, Abraão acreditou”. S. Mateus diz-nos que José, apesar de toda a brutal estranheza do que estava a viver, confiou. Em dias que o desespero possa despontar, há que continuar a abrir a esperança. Em dias em que o cansaço anímico, psicológico, possa aumentar, buscar a fé da riqueza e do sentido de quem se é. 

O silêncio é outro. Também cada pessoa está a tornar-se outra. Que nesta luta, neste combate, neste confronto, apesar de tudo ainda muito difuso, vá despontando, ao jeito de paternidade e maternidade, a beleza do essencial: sermos uns para os outros nas muitas dimensões do Amor. 


quarta-feira, 18 de março de 2020

Breve oração




[Breve oração ao entardecer]

Agradeço-Te 
a esperança em cada rebento, na beleza da vindoura Primavera. Entre perguntas e silêncios, novos tempos acontecem. O nosso ser de futuro constrói-se neste presente de passagem. 

Peço-Te 

humildade na travessia e coração que saiba escutar o ressurgir das flores.

terça-feira, 17 de março de 2020

A Nossa Tarde - RTP





[Coisas na vida de um padre em isolamento social] Partilho a minha conversa em vídeo-chamada com Tânia Ribas de Oliveira no programa A Nossa Tarde, na RTP. Agradeço o convite para dar alento. Que continuemos a fazer caminho em boas partilhas e oração. Que Deus nos abençoe!

segunda-feira, 16 de março de 2020

Chef Paulo Chakall Duarte?



Carla Gomes

[Coisas na vida de um padre em isolamento voluntário] Há sete anos, neste dia, fui ordenado diácono. Dia bonito e intenso, aquele. Dias, não tão bonitos, mas intensos, os de agora. Ainda assim, somos chamados a tentar viver o máximo de serenidade possível. Em casa, claro. (NINGUÉM SAI, a não ser por necessidade fundamental!) Estive a ambientar-me à cozinha da Casa da Torre, já que a qualquer momento há que assumir este serviço. Com humor e vida. Nas “stories” chamavam-me o “chef Paulo Chakall Duarte.” Tomara eu chegar-lhe aos calcanhares na cozinha, mas já deu para rirmos. Uma boa gargalhada liberta endorfinas e serotonina, fortalecendo o sistema imunitário. Vêm tempos duros, não nos enganemos. Mas, que sejam vividos em tempo novo, que já o é na História. Na cozinha, na capela ou no quarto, nos momentos de silêncio, rezo de forma especial por quem tem de trabalhar, pelos doentes, pelos familiares, pelos sem-abrigo e pelos refugiados. Sejamos capazes de dar vida uns aos outros. 

Também nessa linha de dar vida, em especial para estes tempos de estar em casa, os jesuítas em Portugal apresentamos o “Ponto de Abastecimento”. Podem espreitar aqui: https://pontosj.pt/especial/isto-vai-ser-uma-maratona/

domingo, 15 de março de 2020

Ajudas amorosas



Lovely Moments

[Secção outras ajudas amorosas além da importantíssima que é ficar em casa]

- Antes de partilhar textos, imagens, vídeos, gravações, notícias sobre o tema da actualidade ou outros, certificar se são de fonte fidedigna, se faz sentido, se vai ajudar ou causar mais ruído, confusão ou pânico. Se for o segundo caso, de ruído, confusão ou pânico, faça “apagar”, “delete”, “lixo”;

- Para quem tenha essa possibilidade, abrir as portas de casas por arrendar a profissionais de saúde que não possam ir para casa pelo receio de contágio ou que venham de outras zonas do país ajudar nos hospitais centrais;

- Tenho visto muitos amigos médicos e estudantes de medicina a partilhar a disponibilidade para esclarecer dúvidas via mensagem privada nos seus perfis. Como o mundo das redes promove essa possibilidade, caso seja necessário, que se faça isso antes de ligar para a linha SNS 24 ou ir a um hospital.

- Para saídas, compra ou farmácia, organizar-se por prédios e, além de ir pelas pessoas de risco, se não for de comprar muitas coisas, vá uma pessoa de cada vez por todos.

- Já agora, especialmente para os católicos, por me parecerem os mais interessados, aproveitar algo inédito: poder ouvir ou ler dezenas de homilias deste Domingo em diferentes línguas.


E continuemos a rezar, aplaudir, cantar, pôr bandeiras à janela, para dar força a todos os profissionais de saúde, física e mental, de comércio, bombeiros, educadores, polícias, militares, tripulantes, operários que dão o seu melhor na linha da frente.

sábado, 14 de março de 2020

Ficar em casa





[Secção coisas simples que são tanto] Definição actualizada de “ficar em casa”: acção ou gesto de cuidado, respeito, civismo, humanidade, amor por si mesmo e pelo próximo, em especial por quem esteja em risco, implicando apenas saídas por extrema necessidade ou de apoio a quem por risco não possa sair. 


Da minha parte, além de ficar em casa, rezo por Luz e Vida, de A a Z. E às 22h irei  ao terraço juntar-me à corrente de aplausos por quem está na linha da frente. 

sexta-feira, 13 de março de 2020

Ser Luz




[Secção outras formas de cuidar além de ficar em casa]

- São muitos os eventos cancelados, em especial os artísticos. É possível trocar ou pedir reembolso de bilhetes já adquiridos. É justo e legítimo. Mas, humano também seria que cada pessoa, caso a situação financeira permita, doar esse valor à Sala de Espectáculo e assim fazer chegar os pagamentos aos artistas e técnicos que vivem da sua arte e técnica.

- Para quem possa, avisar vizinhos que sejam de risco que se tem disponibilidade: para ir às compras de supermercado ou farmácia; preparar refeições; que estão em contacto para algo urgente.

- Isto para as empresas de telecomunicações: aumentar os minutos, sms e internet para se poder promover a comunicação, em especial para as pessoas que estão mais sozinhas.

- Grande oportunidade para fazer aquelas chamadas, voz ou vídeo, ou enviar mensagens para os familiares ou amigos com quem não se fala há muito.


- Fazer um especial tempo de silêncio meditativos e orante a agradecer as oportunidades que a vida traz, mesmo duras e impostas, para humanizar e ser mais próximo de quem necessita.

quinta-feira, 12 de março de 2020

Breve oração




[Breve oração antes de adormecer]

Agradeço-Te e peço-Te a Luz
a atravessar todas as sombras da ignorância
e iluminar o respeito e cuidado pelo outro,

dando serenidade e respiro de horizonte.

quarta-feira, 11 de março de 2020

Amar o próximo como a si mesmo



[Ser problema ou fazer parte da solução?]

Ser problema:

- “o mal é dos outros”;
- “a mim não me afecta”;
- “isto é tudo pelo dinheiro”;
- “não é um beijinho que faz mal”;
- “acredito na Providência, se morrer vou para o céu”;
- “Jesus também beijou os leprosos”;
- “a escola fechou de quarentena, logo tempo de ir às compras, praia, passear”;
- “estou de quarentena, mas obviamente não estou infectado, logo tempo de ir às compras, praia, passear” (isto é crime de desobediência civil);
Etc.

Fazer parte da solução:

Está em mim contribuir para o bem comum. 
Eu, como QUALQUER pessoa que saia à rua, posso tornar-me um transmissor do vírus, por isso:
- Sair apenas por necessidade urgente;
- Comprar o que REALMENTE preciso na REAL quantidade que preciso, pois outros, tal como eu, também vão REALMENTE precisar (de supermercado e farmácia);
- Por mais que goste, NÃO apertar a mão ou dar abraços;
- EVITO ao máximo hospitais e centros de saúde;
- Lavo as mãos com MUITA regularidade;
- Se estou de quarentena, aproveito para descansar, ler, meditar, limpar a casa;
- Sigo as recomendações OFICIAIS da Direcção-Geral de Saúde.

segunda-feira, 9 de março de 2020

Parar e respirar




Bobby Karle,sj, numa capela de uma Comunidade Jesuítas na Índia

[Secção pensamentos soltos sobre os vírus pelo mundo] Em boa conversa com a Suzanne, surgiu o tema “simbolismo dos acontecimentos”. Olhando para os últimos vinte anos, todas as doenças têm tido o ataque à respiração como principal sintoma. A respiração caracteriza a vida orgânica. Começa com o grito e termina com o “último suspiro”. A respiração é fundamental e nós humanos somos os únicos que a conseguimos ajustar voluntariamente, em inspirações/expirações profundas, tendo efeitos neurológicos. 

O alento, em contexto bíblico, está ligado, de forma especial, a duas realidades: 1) “nefesh”, em hebraico, que depois se traduziu em “psiché”, em grego, e na nossa língua, uma das possibilidades, “alma”; 2) “ruah”, em hebraico, “pneuma”, em grego, e na nossa língua, uma das possibilidades, “espírito”. Depois de moldear o ser humano do pó da terra, Deus insufla o alento divino. 

Os últimos anos têm caracterizado a nossa humanidade desde a produtividade. A economia, os valores de mercado, o dinheiro, o ter, têm crescido em grau de importância, relegando para o lado a importância das relações, da espiritualidade, do tempo, da paragem, do silêncio. O cansaço social está à vista. Escrevi há dias que quando isso acontece o sistema imunológico perde a força. A nossa humanidade, com tantas maravilhas, é certo, está cansada. Quando há cansaço, tem de haver paragem. Curioso como a palavra “fechar” tem aumentado nas notícias. Fechar escolas, fábricas, museus, cancelar voos e actividades, obriga necessariamente a parar. 

Quando paramos voluntariamente, férias, reflexão, oração, somos nós que controlamos o “ter”, sendo o “ser livre” a falar mais alto. Quando somos obrigados a parar, por doença pessoal ou colectiva, reparamos que é o “ter” que nos controla, estando o “ser” subjugado, não só o ser-pessoal, como o ser-colectivo, incluíndo a natureza. 

Temos abusado dos recursos naturais, destruindo florestas. Também quando chove aumenta a lamentação pelo incómodo, esquecendo que a chuva limpa os ares. De facto, os vírus (incluíndo o da desinformação), dentro do mal, estão a alertar para a paragem necessária na humanidade, cultivando a interioridade, a reflexão em autenticidade, ajudando a tomar consciência do que significa amar o próximo como a si mesmo. Cada pessoa tem mesmo de fazer a sua parte, para que todos, incluindo a Terra, possamos respirar bem e sem medo, ou seja, plenamente livres. 


Pequenas dicas: para quem está já em paragem forçada em casa, reservar um pequeno tempo para a lamentação, queixa, dor, tristeza, depois, aliviando essa tensão, aproveitar a oportunidade para ler, escutar-se, conhecer-se, cultivar-se humana, cultural e espiritualmente; quem não está em paragem forçada (e espero que não seja necessário, obviamente), pode pensar como tem sido o parar na vida, no quotidiano, e tomar consciência do bem que pode fazer a si e aos outros. 

domingo, 8 de março de 2020

Dia da Mulher



[Secção pensamentos soltos em dia da Mulher] “Deus criou o ser humano à sua imagem, criou-o à imagem de Deus; Ele os criou homem e mulher.” Que beleza de versículo, este do Génesis. A imagem divina interliga-se na complementaridade entre masculino e feminino. Não há luta, nem competição, nem desnivelamento, apenas a dualidade, como duas faces da mesma realidade, que revela a força da relação. E Deus, neste sexto dia, viu que era muito bom. Falta passar esse “muito bom” para a actualidade, curando feridas de desrespeito e desproporção pela Mulher, no seu sentir, viver e agir, renegando a sua capacidade de ser igual ao homem na dignidade. Sinceramente, não se trata de feminismo, isto de apelar pelo respeito da Mulher, mas de Humanidade. Escrevi outros tempos e repito, infelizmente ainda temos de ter presente estes dias para recordar o que deveria ser óbvio: o respeito na dignidade para além de qualquer género. Mas, já que o dia aí está: Mulheres, agradeço tudo o que aprendi e aprendo convosco.

quinta-feira, 5 de março de 2020

Fragilidade




[Secção pensamentos soltos sobre a fragilidade…também dos padres] Tomar consciência da complexidade do ser humano deveria ser caminho para perceber que o ser humano é complexo. Sim, começo o texto com uma grande redundância. Sinto-a necessária para descrever o que me sai em breve reflexão sobre a fragilidade. Muito conhecimento em tantas áreas científicas à volta do ser humano deveria ajudar à maior compreensão, compaixão, respeito. O que acontece é a exigência ao ser humano de substituir a máquina e tornar-se peça de engrenagem a produzir. Resultado: cansaço físico, humano, social, político e espiritual. É sabido que quando há cansaço o sistema imunológico enfraquece. De algum modo, as defesas sociais, presentes no cuidado, no acompanhar, na compaixão, diminuem drasticamente com o medo, a vergonha, a pressão de ter-se de ser quem não se é. Fica bem dizer-se que se acolhe a fragilidade, mas vivê-la é terrivelmente duro. Já vem dos primórdios da humanidade essa vergonha que leva a cobrir a nudez, o despojamento, a fragilidade, com folhas. Ainda assim, é fundamental a verdade, ou autenticidade, connosco próprios. Vem tudo isto a também a propósito de um artigo que li (mais um) sobre o esgotamento dos padres, ao ponto do suicídio. Um valente murro no estômago. Do que se sabe, todas as situações desde a exigência tremenda de corresponder a expectativas de firmeza, completude, disponibilidade, por um lado, e, por outro, de luta contra a imagem denegrida de tanto mal feito ao longo de tantos anos de história da igreja. Luz e sombra de mãos dadas, onde, no cansaço, ressalta a sombra. Todos no mesmo pacote. Cada um com o seu sentir. A sabedoria de Jesus ao afirmar o grande dogma de que só Deus é absoluto será, para mim, a sanação de muito. Curiosamente, de simples que é, torna-se difícil, já que os pequenos e grandes ídolos vão-se infiltrando no coração e escravizam. Os padres do deserto insistiam muito no silêncio, na distância da realidade para dar-se conta do que divide e impede a simplicidade e o amor. Ao longo dos tempos fomos tendo mais adereços para justificar a existência. No entanto, essa existência, além de não necessitar ser justificada, abre-se à luz desde a verdade vivida de entranhas da outra perspectiva do grande dogma: o amor de Deus por cada um de nós é absoluto. E como conhece profundamente a complexidade do ser humano, desafie tanto a nos amarmos como Ele nos amou. Atravessamos tempos que convidam ao silêncio para passos de cuidado uns pelos outros, nem que seja pela oração ou pensamento, atravessando as sombras com a luz de vida.