[Secção coisas de corpo, com as devidas licenças para partilhar] Após alguns encontros, em que aflorámos sombras e abrimos perspectivas sobre religião e imagens de Deus:
- P. Paulo, recorda-se de ter partilhado há tempos numa publicação que escutou uma pessoa viciada em sexo?
- Sim, sim.
- Falava-lhe do medo de ser julgada e gozada. E ao mesmo tempo a dor que isso provocava, acrescendo ao vício.
- O nosso contexto social quanto ao tema sexo é de extremos: ora gozo, ora tabu. É preciso equilibrar o natural com a razão. Mas, para isso, é fundamental escutar sem julgar. É verdade que o meio religioso não ajuda muito. Moralizámos demasiado o genital e o sexual. E, falar, se é que se fala, de pénis, vagina, glande, clitóris, vulva a tendência geral é remeter logo para a ordinarice, o porco, o sujo. É necessário ganhar maturidade e perder medos.
- É mesmo por essa sua naturalidade a falar dos temas que quero partilhar algo. [Silêncio, cabeça baixa] A minha obsessão por sexo. [Silêncio] Reduzo tudo ao sexo, tendo depois muitos pensamentos aí centrados. [Começam as lágrimas e o grito] Eu não sou uma p***, mas sinto-me tão assim. Eu estou condenada ao inferno, não estou?! Foi o que me ensinaram desde pequena!! [Estava enrolada sobre si, como que a desaparecer.]
Deixei que emoção mais forte saísse.
- Concentre-se na respiração. Peço-lhe que relaxe e abra os ombros, os braços, aos poucos, ajuste-se no lugar. Mantenha a respiração. Aqui estou. Agora, erga a cabeça. Isso. Dignidade em si. Os rótulos são acessórios. A Jane [nome fictício] não é rótulos, mas pessoa a viver muito. Mantenha a respiração. Aqui estou.
- Não me está a condenar?
- Respiração. Traga a consciência de si, aqui e agora. Com todo o seu ser. Ninguém tem o direito de condenar nenhum ser. Mas, o dever de compreender. Daí a faculdade da razão. Deus deu-nos a razão para compreender e ajudar a fazer caminho de liberdade. O sexo faz parte de nós. O que há a fazer é ajustar essa intensidade e perceber de onde vem essa intensa pulsão, com calma e respeito pelo seu tempo.
- Eu tenho salvação?
- O seu nome está inscrito na palma da mão de Deus. Agora é tempo de continuar a encontrar-se consigo mesma e amar-se. É caminho exigente, mas libertador.