segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Tempo e espaço para o luto




Aurora Simionescu


Este fim-de-semana uma aluna nossa perdeu o pai. Pela doença, já esperava o que, apesar de tudo, não se espera. Nisto de preparar o seu regresso à escola, fui à turma falar do luto e de como ajudar a vivê-lo. O básico: pode haver as fases do luto, mas não se o vive de igual forma. O mais importante é respeitar os tempos de quem por ele passa, dando também o necessário espaço. Estar presente, na delicadeza de mostrar a atenção de forma mais ou menos subtil e não fazer qualquer julgamento. Não, não se tem de chorar. Pode até parecer que a pessoa esteja insensível a tudo. Os tempos e as formas não são iguais. Sim, estar atento, ajudar a fazer caminho da mudança de relação. No fundo, o luto é tempo, espaço, vivência, em que a relação muda. E fizeram o silêncio de quem mais queria saber para melhor amparar.

domingo, 28 de fevereiro de 2016

Ainda Tillman




Samuel Silva

[Secção outros tons] Ainda Tillman, em acrescento de asa: alonga-se o horizonte que faz transportar fronteiras daqui-ali. Transportar ou dissolver? É preciso aterrar as horas, as perguntas, o medo do outro e perceber que no amor ao próximo, que vê pessoas, somente pessoas e não categorias, é possível o perdão. Para isso há a dar tempo às cinzas… nesse gradiente de cor e passagem… para fertilizar com terra sagrada.

Pausas de beleza




Momento em que víamos duas fotos de Tillman que se complementavam, por Maria Pereira


Descansos de beleza ou pausas de contemplação: na 6.ª com Dimitris Papaioannou, ontem à noite com Satie, pelas mãos da Joana Gama ao piano, e hoje com Wolfgang Tillmans e Liam Gillick. Mexe, mexe muito viver boas obras ou estes descansos ou pausas. Passou-me imenso pelo pensamento (em linha dos pensamentos soltos do post anterior), junto com as boas conversas que proporcionaram todos estes momentos. A arte não é um capricho, é força de humanidade e de transcendência. Abre portas a caminhos, a interrogações. Isto é tão óbvio, sim, mas quando se (re)vive o novo estremecer, (re)pára-se e percebe-se ainda mais a importância da beleza e da contemplação. E daqui a pouco, na Missa, falarei do descalçar-se para deixar-se tocar pela terra sagrada.

sábado, 27 de fevereiro de 2016

Em resumo do complexo que vai cá dentro.



Jing Wei


[Secção pensamentos soltos] Talvez pudesse escrever em duas frases ou três versos ou palavras, nessa ânsia de resumir o complexo, o que vai cá dentro. Talvez por ter parado ontem com Sísifo diante e hoje silenciado mais por aqui, no quarto, em leituras on-line e papel, sobre a “filosofia, como arte de pensar”. Junta-se a teoria com o acontecimento histórico e volto à pergunta: “quem é o ser humano?” Reconheço a faceta de certa ingenuidade por aqui, mas também esta escuta de belezas; de incoerências; de hipocrisias; de motivações de vidas; de “este aqui não é para trabalhar, é para cuidar”, dizendo um pai, humilde de vida, de trabalho e de história, com carinho, sobre um filho com deficiência; de brilhos de olhar de alunos com sede de conhecimento e de ternura, alguns na sua agressividade nada mais fazem que chamar a atenção. “Pergunto-me: não podia aperceber-me sozinho de que existo? Parece que não. Parece que é preciso que seja outra pessoa a avisar.”, como escreveu Erri de Luca, no romance “Montedidio”. É isso, precisamos de muita agitação de alma, coordenada com movimentos que se entregam à força da terra. No silêncio da minha oração, entrego tudo a Deus. Entre[ ]tanto, sigo em caminho de encontro… e assim escrevo numa frase em resumo do complexo do que vai cá dentro.

Still Life de Dimitris Papaionnou




Miltos Athanasiou


Fui ver o “Still Life” de Dimitris Papaioannou. A grande base de inspiração é o mito de Sísifo, junto com a obra de Albert Camus. Absurda, essa eterna subida e descida de montanha, de pensamento, de teorias, carregando pedras, perspectivas, posições, que voltam a rolar. Entre o humor e o silêncio rompido por sons de realidade aumentados, em mim ficou a pergunta: como mudar padrões de fechamento para padrões em que o amanhecer leva à cor e à vida? Neste dias, em que naturalmente ainda se responde à violência com mais violência, onde é que a marca de carregar muros se pode tornar asas de anjo? Libertando-se as pedras, os blocos de pedra, carrega-se finalmente, em comunidade, a mesa da partilha.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Cartaz(es)




Encontro de He Qi

[Secção desabafos] Há histórias à volta do belo, tal como do feio. Umberto Eco escreveu sobre isso. A Religião sempre foi inspiração para o melhor e para o pior. Felizmente, temos muito de melhor. Basta dar um bom passeio demorado pelos grandes museus, seja de arte mais antiga, moderna ou contemporânea, desse mundo fora. Claro está, a arte não se fica pelo simplesmente bonito. A boa arte acaba por transmitir uma mensagem, desde o simples “limita-te a contemplar” ao grito de injustiça de tanto. A política nunca se descartou desse factor de arte como provocação. Há uma óptima ala no Rainha Sofia em Madrid com esse tema. Mas, imiscuir política e religião, mesmo que seja para “pôr a sociedade a falar sobre isso” nunca deu muito bom resultado. Vá, em tempos de direitos, parece que tudo é possível, até mesmo chocar por chocar, ainda que seja em nome de “pôr a sociedade a falar sobre isso”. Mas, é assim que funciona? A partir do choque pelo choque? Sinceramente, como padre, vejo o famoso cartaz e deu-me vontade de rir, pelo poucochinho. Não, não vou rasgar vestiduras, que isto do voto de pobreza não dá para andar ai a rasgá-las a torto e a direito. O que me parece é que a sociedade que vive o “falar disso” a partir de choque e escândalos não é de todo uma sociedade adulta. Falta-lhe perceber os limites, os critérios, a orientação do sentido de diálogo entre partes que até nem têm de acreditar no mesmo. Quem fez o cartaz é capaz de neste momento estar a regozijar de alegria “yes!! Conseguimos pô-los a falar disto!!” No entanto, é um falar fora das regras de bom senso, onde faz brotar os fundamentalismos mais sub-reptícios, ora de “intolerantes estes os religiosos”, ora de “lá está a esquerdalhada sem filtros”. Pois, o poucochinho activa o poucochinho de ambas as partes. Quem se interessa minimamente pela vida de Jesus, seja crente ou ateu, mas respeitável, perceberá que injurias, gozos, escárnio, etc., já Ele o sofreu com a dignidade própria de quem mostrou o caminho da Humanidade. Mas para isso de caminho de Humanidade é preciso ser coerente e estudar, ou basta ler, um pouco mais as coisas até mesmo de Arte e de Religião, sem se limitar ao “pôr a sociedade a falar sobre isso” com um cartaz em jeito de Pop art. Acredito no Deus com humor, daquele que sorri com o ridículo e que meneia a cabeça com a falta de maturidade nas atitudes, tanto dos que provocam, como dos que são provocados. Queremos ser uma sociedade de futuro, vanguardista, “fixe”, mas, para isso, parece-me que ainda há crescimento para acontecer. Isto do respeito tem muito que se lhe diga.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Conversas e leituras






Elliot Ross


Há conversas que ajudam a compreender leituras feitas. Não só leituras de textos, como de acontecimentos. Estava a comentar sobre uma situação que me incomodou. A meio da conversa, apercebo-me de que fazia um julgamento da pessoa presente na situação. Foi muito subtil, mas estava lá. Afinal, o que se passava é que queria, sem o manifestar, que a pessoa num determinado aspecto fosse como eu. Aprofundando ainda mais, foi claro que estava a tocar uma pequena ferida emocional minha. Ora, para também não entrar em culpabilizações, nada como dar nome a tudo com verdade e sem estar com juízos de valor comigo mesmo. Foi o passo seguinte. Dá vergonha, sim, mas foi libertador e possibilitou-me mais um ensinamento vivido. Esta conversa ajudou-me a dar ainda mais corpo a leituras feitas, tais como, o encontro de Jesus com a Samaritana, com a mulher apanhada em adultério, com Zaqueu, com Pedro... que depois de tudo o que Ele fez, ainda o negou 3 vezes. É isso, vivo Quaresma... em caminho de conversão para a autenticidade, respeito e serviço. 

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Vocação e programa A Praça




Teresa Lamas Serra

Isto de seguir Deus, de forma especial em consagração religiosa, há de sempre causar dúvidas e curiosidade. No domingo passado na TVI passou uma reportagem com as histórias de algumas vocações religiosas, entre as quais a do Luis Palha, um companheiro jesuíta. Daqui a uns dias, serei eu que irei ao programa A Praça falar da minha vocação. A minha primeira ida lá há umas semanas com os alunos que fizeram o vídeo sobre o Sr. Agostinho e família (que estão entre os finalistas do concurso “Ciência em Cena” sobre doenças neurológicas, nesta caso a ELA) teve conversa de bastidores e terminou num “e se o padre Paulo viesse cá falar do imenso da sua história?” Falando com quem de devido, pareceu que seria de ir, sim. O Hélder Reis esteve por cá hoje, no Colégio, a fazer uma pequena reportagem para o dia do directo (que direi em breve quando será). A ideia é mostrar um pouco do meu quotidiano aqui no Colégio. Alguns momentos, se os puserem, vão ter bastante piada. Outros, bem, calma lá, acho que tenho de contar algumas sombras em directo, pois as perguntas sobre o professor Paulo tiveram só louvores como resposta, mesmo quando lhes disse que não subia a nota… ;) Enfim, para os meus alunos do 5.º ano do INA e do 1.º de Comunicação da Oficina, o dia de hoje foi uma verdadeira animação. Veremos em breve o resultado da reportagem, com o directo lá n’A Praça, a falar da minha relação e vida com Deus.


terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Bom senso




Chuan Teik Heng


Quando aprendi a conduzir, uma das coisas que me chamava a atenção e que não tinha propriamente objectividade era a “moderação”. Até me chegou a sair no exame de código algo relacionado com “velocidade moderada”. De vez em quando, nos painéis da auto-estrada lá aparece “Com chuva conduza com moderação”. Ora, isto da moderação apela ao bom senso. Não há um dado objectivo do tipo “87 gramas de bom senso” ou “113 km/h de moderação”. Percebe-se que a moderação ou o bom senso surge com a experiência, que vai dando consistência à sabedoria. Em muito radicalismo com que nos deparamos, no âmbito social, político, religioso e/ou cultural, pode haver falta de bom senso, ou, noutras palavras, de educação, pela observação atenta, pela leitura diversificada, pela escuta do outro, pelo uso articulado de razão e de emoção. Ter bom senso e saber aplicá-lo é sinal de maturidade.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Quaresma. Silêncio. Encontro.




Olinda Morgado


Em cada ano vou compreendendo um pouco mais da densidade da Quaresma. É tempo de silêncio. De dar ainda mais tempo ao silêncio, para que se possa perceber a importância do muito que nos acontece em cada dia. Pode haver quem possa gostar do peso da dor, mas, mais do que carregar no sofrimento, deve ser caminho de alívio... até chegar à leveza da Passagem. Deus não nos pede “estupidezes”, mas a autenticidade, junto com a libertação de correntes que impedem a disponibilidade de serviço ao outro. E aí dá-se encontro, para além de qualquer julgamento.

domingo, 21 de fevereiro de 2016

Párocos e missas em série aos domingos




Dulce Antunes - momento em que, na minha ordenação, dou o abraço sacerdotal ao P. Mário Sousa, grande amigo e pároco da Igreja Matriz de Portimão

Este fim-de-semana foi vivido de forma diferente. No sábado, de manhã até ao início da tarde, estive no Click it Scout (um encontro para escuteiros, com palestras em formato TED). Boas conversas surgiram, a partir de bons projectos partilhados por ali. Os organizadores estão de parabéns. Tenho a sensação que muitos viveram verdadeiros “Click’s” de coisas a pensar e a viver, com o tanto que foi ali partilhado. Depois fui celebrar Missas em Eiriz, Carvalhosa e Senfins, no Concelho de Paços de Ferreira. O P. Tiago, pároco daquelas comunidades, foi fazer uma formação e pediu-me para lá ir. Uma nova experiência. Não o de celebrar Missas, evidentemente, mas o de celebrar muitas Missas em pouco tempo. Foram 4 e não foram mais, pois acabou por pedir a outros padres para celebrar noutras comunidades. Como não sou pároco, apenas tenho ouvido as partilhas dos meus colegas que têm à sua responsabilidade muitas comunidades. Não faz sentido comparar cansaços, apenas fiquei a pensar o quanto pode desgastar isto de celebrar Missas em série aos domingos. Eu vivi bem, além de as comunidades serem muito vivas, organizadas, participativas, o que ajuda bastante, foi uma vez. No caminho, de regresso a casa, vinha em pensamentos soltos: “e se isto fosse assim todas as semanas, terias o mesmo fulgor?” Tem de haver grande força, de oração, de entrega, de companheirismo, para poder viver a densidade do que significa celebrar cada Missa com ânimo e disponibilidade. Compreende-se quando surge o cansaço, com os riscos de tornar a celebração mais ritualista, que verdadeiro e sentido ritual. Eu vivo muito a Missa como um grande momento coreográfico, onde cada gesto é habitado, dando silêncios e deixando-me embrenhar pelo mistério da força do ritual. Como padre sou intermediário da graça de Deus… e não quero ser um funcionalista do ritual. Mas estes dias ajudaram-me a perceber que pode haver esse risco… e também a compreender ainda mais os meus colegas párocos, em especial os que têm a missão de levar pela frente muitas comunidades. Um Abraço especial, com a minha oração, a todos os meus colegas párocos.



sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Contraste entre o melhor e o pior




Fotograma do vídeo com as muitas flores do casal Kuroki

[Secção desabafos] Podia dar muitos exemplos dos contrastes entre o melhor e o pior do ser humano, mas fico-me por dois: por um lado, as selfies com a cria de golfinho que acabou por morrer; por outro, o Sr. Kuroki, japonês, que plantou milhares de flores para que a mulher, que cegou, pudesse sentir o cheiro das flores e assim voltar a sorrir. A selfie, como qualquer foto, pretende registar momentos únicos. Mas de que serve registar esses momentos únicos se não são vividos por se estar preocupado com a selfie? Ou, pior ainda, que leve a voltar a ver a foto com o golfinho e pensar que morreu à força dessa ganância de ter sido tirada? Este é mais um exemplo em como se pode chegar a tal consumismo, tanto material, como imaterial, que se esquece o saborear as coisas, com o respeito pela realidade que nos circunda. Não, não se está só no mundo. As criaturas, do plancton às árvores, passando pelos corais e musgos, são essenciais para o equilíbrio planetário. De facto, se se descarta com facilidade pessoas, o resto torna-se algo a uso, pior, a abuso, sem problemas de consciência. Com isto, percebe-se que há grandes riscos de perder o sentido de humanidade. No entanto, há laivos de esperança, de quem reconhece o bem que se faz na entrega ao outro a partir da mesma beleza da natureza… despertando sentidos e emoções. Deus convida-nos a ser, não destruidores, mas co-criadores, de vida, de arte, de sonhos, de respeito, de natureza e de humanidade, com Ele.




quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

"post-de-nada" ;)




Ana Gonçalves Pereira

[Secção “posts-de-nada-que-às-vezes-também-acontece”] Sou daqueles que têm fortes momentos de criatividade quando está quase a adormecer. Ontem foi mais uma noite onde passaram pelo pensamento, com muita emoção, entre outras coisas, textos que gostaria muito de escrever. Pensei também em ir buscar algo para apontar… pelo menos as ideias principais. Veio a preguiça. Ela vem muitas vezes. “Ah, eu lembro-me amanhã.” Tantas vezes repito isto. Tantas vezes esqueço aquilo. E afundo-me no sono… e nos sonhos (que são muitos).


sábado, 13 de fevereiro de 2016

Igualdade e igualitarismo




Louisa Marie Summer


"Oh stôr, está a ser injusto. A ela deixou e a mim não." Sorri e aproveitei para explicar a diferença entre igualdade e igualitarismo. "Todos têm direito à educação, mas nem toda a educação tem de ser igual. Tenho a obrigação de vos respeitar na vossa dignidade, algo que é igual a todo o ser humano. No entanto, enquanto educador, percebo que para um pode ajudar mais isto que aquilo. Se nalgumas coisas fizesse exactamente do mesmo modo para todos, estaria a desrespeitar a diferença. O fundamental é ajudar a crescer, também a partilhar convosco as ferramentas que vos ajude a tomar as melhores opções no caminho da evolução humana e espiritual. Neste caso, parecia-me que deveria deixá-la ir e a si não. Pense lá, que de tótó tem pouco, estou mesmo a ser injusto? Se estou, não tenho problemas em pedir desculpa." Deu um sorriso e acenou com anuência. [P.S. - E não, não sou dos que acha que o professor tem sempre razão. :) ]

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

[...]



Arthur Matsuo

[Secção outros tons] São pássaros a voar, fugidios de chuva e de vento. Imbatíveis, quebram gravidade. A janela embacia-se com o vapor de chá de violeta imperial. De nada, aparentemente, por contar, escreve-se o quotidiano. Dando espaço ao silêncio, mais uma página é folheada, quase encerrando o capítulo.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Bom tempo




Guy Anderson


O dia convida ao recolhimento. O que tanto se designa por “mau tempo”, pode ser bom tempo, belo até, para dar início à viagem de nova passagem. O gradiente do cinzento não ofusca a cor… pode relembrar a serenidade de memórias, clarificadoras do mistério do próprio presente. Há pouco, enquanto rezava, perguntei a Deus: que queres que de mim reduza a cinzas? Só Deus consegue amar-me ao ponto de me ajudar a ser como Ele. Num primeiro momento assusta pensar nisto: ser como Deus. No entanto, toda a revelação aponta a esse saber perder capas, máscaras, camadas que impedem a força da luz interna brotar como ramos que nos fazem encontrar em comunidade, de respeito e misericórdia, uns com os outros. Este caminho de cinzas é caminho de liberdade. Não renegando o passado, aceita-se sem que massacre, para queimar o que impede de viver… e veremos como a própria cinza torna a terra, banhada com a água de inverno, ainda mais fértil.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Ainda em Carnaval... ou em flexibilidade.




Cristina Lima


Há pouco, no post anterior, escrevi sobre flexibilidade… e agora acabo de receber esta foto do fim-de-semana passado com alunos. Antes que o dia de Carnaval acabe, recordo que a credibilidade de um padre (pelo menos este que escreve), também é medida pelo humor com que vive. ;) 

Flexibilidade




Pai José


Achei piada quando descobri esta fotografia. Comecei a praticar ginástica acrobática com 13 anos. Recordo bem o esforço de treinar a espargata para ir a competição. Ainda não estava no ponto, mas, como se nota, já ia avançado. Ganhar flexibilidade exige trabalho. Não só flexibilidade de corpo físico, mas também de espiritual, psicológico e social. Uma das técnicas é começar pelo amor-próprio. Gostar-se realmente de quem se é, é mais difícil do que parece. Implica conhecer, tanto do que é bonito e agradável, como do lado sombrio que incomoda. Depois, começar a estar atento ao outro, na sua diferença, sem fazer o julgamento imediato, rotulando-o seja do que for. Algo igualmente fundamental, perceber onde é que os estereótipos vão entrando e obrigam a que “tenha de ser assim porque sempre foi” ou “há que mudar porque sim”. Ganhar flexibilidade, poderá significar sair da rigidez para a compreensão. No fundo, deixar que o coração de pedra se transforme em carne. 

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Trabalho de corpo




Naing Thu Soe


Cheguei há pouco de uns dias com os alunos do 12.º ano da ARTAVE (a escola profissional de música do complexo escolar onde trabalho). Esta manhã propus-lhes exercícios de corpo e de dança, onde se incluiria muito de trabalho de confiança e autenticidade, com eles próprios e com toda a turma. Mais uma vez, houve verdade. No princípio, surgiram os risos e os olhares que revelam a sensação de ridículo. No entanto, das muitas vezes que propus este tipo de trabalho de corpo, foi aquela em que senti a imensa entrega, de cada um e do conjunto, de forma mais rápida. Alguém, na partilha final de todo o exercício, usou mesmo a expressão de ter percepcionado momentos de limpidez. Houve momentos de gestos limpos, que levaram a olhares de agradecimento e de perdão entre eles. Isto de explorarmos o trabalho de corpo, em territórios desconhecidos, abre muito de nós. Apercebo-me do muito medo que há com o que o corpo pode potencializar e dar a conhecer de quem se é. São séculos de centralizar o conhecimento na cabeça, na “fria” razão, onde se encaminha para a formatação do próprio humano. Quando se habita o movimento, há muita novidade… junto com o despertar do que está abafado por tantos medos, inseguranças, vergonhas.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Agradecer ser padre




Hideki Mizuta


Há dias que marcam de forma especial simplesmente por ser padre. Hoje foi mais um. Só que não é “mais um” em sentido de desvalorizar ou relativizar, mas de agradecer a vocação de forma especial. Apenas fiz o esperado. No entanto, é sempre bom ver, no meio de tanto sofrimento, o brilho de olhar e ajudar a devolver cor à vida.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Dons, capacidades, talentos, virtudes




Prasad Perakam


Tenho-me apercebido da grande dificuldade que muitas pessoas têm para aceitar os seus dons, capacidades, talentos, virtudes. Talvez por surgir o medo ou a vergonha do julgamento com frases do tipo “convencido(a)!”, “quem acha que se julga?”, “olha, este(a) a se armar”, “olha a imensa modéstia que por aqui anda” dito com ironia, acaba por dar-se a dificuldade no reconhecimento dos dons. Ninguém é bom em tudo. Mas também não há ninguém que não tenha dons. Gasta-se tanta energia tanto quando se rebaixa alguém, como quando não se é devidamente valorizado. Por isso, parece-me que devia usar-se bem essa energia, por um lado, a (re)conhecer e a agradecer os dons que se têm, por outro, a (re)conhecer e a agradecer os dons que os outros têm, pondo-os todos a render, sobretudo no caminho da humanização.