[Secção pensamentos soltos em tempos de tanto] Ser padre é ser dador de vida. Assim acontece quando acompanhamos na escuta, nas celebrações, no permitir que o amor se torne mais intenso e dê frutos. Chegou-me esta imagem com rosto a formar-se em vida profunda. Celebrei o casamento dos pais, ambos médicos em que ele está na linha da frente. Fico sempre maravilhado por esta continuidade na relação. E, nestes tempos de tanto, partilharam beleza de vida a dizer: aqui estou. Também um amigo poeta partilhou comigo este belo trecho de Rabindranath Tagore: "Cada criança que nasce é uma prova de que Deus não perdeu a esperança em relação à Humanidade”.
Estes dias estão a ser muito duros. Somos bombardeados com informações de tensão, desconfiança, desunião, cansaço, medo. Parte, infelizmente, teve de ser. Gritos para que se perceba a dimensão da tragédia, de modo a agir política e socialmente em conformidade. Outra parte, para os que, em consciência, naturalmente se resguardam em respeito, pode ser aflitivo. Andar nas redes pode ser fonte de agitação. Em muitos rostos estão a surgir véus de cansaço, de sensação de perda de sentido, de se achar que não se aguenta mais, de desespero.
Então, hoje, trago um rosto como sinal de esperança. Não temos tudo o que gostaríamos, atravessando o grande desafio de muito perder. Mas, tal como uma criança naturalmente acolhe a sua dependência para o caminho da vida, atenuemos as tensões e façamos caminho de sermos uns para os outros os suportes, materiais, afectivos, espirituais, possíveis. Ah, e para os lhes salte “é-muito-bonito-o-que-escreves-porque-não-estás-em-tele-trabalho-sem-paciência-e-a-aturar-os-miúdos, AHHHHHHHH”, ser dador de vida também é acolher as dores sem julgar. Apesar da vontade de os atirarem pela janela fora, continuarão a ser sinal de esperança a partir do amor que recebem. Já agora: se os atirarem, vão buscá-los rápido. É para ficar em casa.
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