domingo, 30 de dezembro de 2018

Liberdade e felicidade no caminho de Vida




[Secção pensamentos soltos] Estes dias particulares são dados a retrospectivas e desejos. Em mim, ainda ecoam os efeitos do Natal. Faz-me cada vez mais confusão o modo acelerado com que tudo se vive. Parece que se cumprem dias, momentos, encontros, ao jeito de check-list, e já está, já passou, já foi. Será mesmo? Sim, se se ficar por um cumprimento da realidade sem a saborear, impedindo que a mesma nos abra caminho de crescimento. Nas relações, nos acontecimentos, como na fé, se não se aprofunda, fica tudo numa passagem superficial. Até sou capaz de dizer as palavras bonitas e os gestos “natalícios” e dar muitos presentes. Mas, como dar tempo para prolongar esses efeitos, o sentido do que significa presentear(-me) e ser presenteado? Como dar tempo para torná-los vida para além desta época, em acções que me ajudem a aprofundar o meu Ser de amor ao próximo como a mim mesmo? Não sei o que o próximo ano me reserva. Assim sentia há um ano. No entanto, quando olho para trás sinto muito agradecimento a Deus e a tantas pessoas, em conjunto com a vivência de lutos inesperados. Talvez por isso, este sentimento crescendo de amar a luz e a sombra, aprendendo com tudo. Não é nada fácil. Pelo contrário, é tal a exigência que impele-me a um cada vez maior silêncio para perceber esse Amar tudo. Assim, a olhar para o infinito que tenho diante, quero continuar este caminho de Amar, entre o conhecido e o desconhecido, e assim deixar que a fé vá ficando cada vaz mais do tamanho de um grão de mostarda. E, no que me for permitido, continuar a ajudar as pessoas a serem profundamente livres e felizes nos seus caminhos de Vida. 

P.S - são “pensamentos soltos” sem que sejam ainda os votos de Bom Ano. [Foto: Suzanne Rodrigues]

sábado, 29 de dezembro de 2018

Cabeça de descanso



[Coisas na vida de um padre] A cabeça muitas vezes precisa de descanso, é certo. Mas, de vez em quando ela mesma se torna pouso e sítio de estar/descanso para o Xiribiri. Enfim...

terça-feira, 25 de dezembro de 2018

Viva o Natal




Este ano voltei a celebrar a Missa do dia de Natal no Carmelo de Fátima. Rezei o abecedário e assim trouxe ao coração todos os nomes diante do Menino. Partilho a homilia de ontem da Missa do Galo. Bom, Feliz e/ou Santo Natal a todos os que por aqui nos vamos encontrando. Que a Luz do Menino vos ilumine todas as sombras.


Homilia Noite de Natal 2018

“Natal. E, só pelo facto de o ser, o mundo parece outro. Auroreal e mágico. O homem necessita cada vez mais destas datas sagradas. Para reencontrar a santidade da vida, deixar vir à tona impulsos religiosos profundos, comer e beber ritualmente, dar e receber presentes, sentir que tem família e amigos, e se ver transfigurado nas ruas por onde habitualmente caminha rasteiro. São dias em que estamos em graça, contentes de corpo e lavados de alma, ricos de todos os dons que podem advir de uma comunhão íntima e simultânea com as forças benéficas da terra e do céu. Dons capazes de fazer nascer num estábulo, miraculosamente, sem pai carnal, um Deus de amor e perdão, contra os mais pertinentes argumentos da razão.” Miguel Torga, ‘Diário (1985)”

Recordei este texto de Miguel Torga por estes dias passados de Advento. É uma rápida descrição deste momento de Natal que o mundo celebra. No entanto, para mim, mais do que “o mundo parece outro”, o mundo é outro. Só pode ser outro. 

Ao longo do Advento fomos preparando os caminhos até esta gruta. Os profetas, em textos cheios de ânimo e esperança, foram-nos ora sussurrando ora gritando a certeza da nova Luz que trará paz e sentido a cada uma das nossas vidas. Se estivermos atentos, há desconcerto nas profecias e nos acontecimentos. Aparece Gabriel e a multidão de anjos, em anúncios de vida, mas, sobretudo, de fim de medos e temores. Afinal, neste Menino a criação atinge a plenitude. Explico-me:

No princípio era o caos, diz-nos o Génesis. A primeira palavra de Deus é “Faça-se Luz!” Desde aí, a escuridão dissipa-se diante do poder divino criador. São João, ajustando o Génesis, dirá “no princípio era o Verbo”. Dinamismo criador que nos leva a perceber a importância do movimento para sentir a vida. O nascer da luz, em palavra dita por Deus, ordena a desordem e chega à criação do ser humano à Sua imagem e semelhança. Marcas divinas, diz-nos Ireneu de Lyon, ficam incrustadas em barro moldado. Deus olha a obra suprema da Sua criação e vê que, mais do que boa, é muito boa. Somos nós. Cada um, cada uma, de nós. Por isso, nos juntamos em festa, nessa irmandade de carne que atravessa a nossa história. Em personalidades diferentes, os mesmos átomos, as mesmas moléculas, fazem de nós seres únicos e especiais aos olhos de Deus. 

Mas, algo faltava. Ainda recordando Ireneu, esse barro moldado também ficou nas mãos de Deus. Atrevo-me a imaginar o pensamento divino: “também quero ser parte desta carne.” Inácio de Loiola, nos Exercícios, no início da segunda semana, convida-nos a contemplar a Trindade a observar a Terra. Vê a humanidade, em particular os traços de sombra, entre guerras e injustiças, entre medos e confusões, apercebendo-se de que chegava a altura de enviar o Seu Filho. 
- Estás pronto?, pergunta-lhe. 
- Seja feita a Tua vontade!, responde.
- Viverás tudo. Descobrirás cada emoção, cada toque de pele, cada sentir de silêncio e de alegria. A tua história fará parte da história, onde as dores de cada humano serão as tuas dores, onde as celebrações de vida de cada humano serão as tuas celebrações. O teu nascer será agitado e discreto. Nascerás e morrerás fora. Mostrarás que a tua vida é plenamente dentro da humanidade. Estás pronto?
- Sim, estou. E lá, em cada casa, em cada coração, estão prontos?
- O Espírito rejubila-se com a resposta de Maria: Sim!

Maria, sabemos, é fundamental. A humanidade acede à vinda de Jesus. Esse “sim” foi e pode continuar a ser o nosso “sim”. Permitir que Deus transforme o nosso coração em lugar onde quer habitar. Pergunto: será que me disponho a ser lugar de Deus? Pode tornar-se bonito e poético tudo isto, no entanto é de recordar que os 9 meses até chegar a esta noite foram de total transformação nas vidas de Maria e de José. Acusações de adultério, caras voltadas pela incompreensão de aparente "grávida-de-outro", em conjunto com a firmeza e a confiança de amor um no outro, alicerçados na fé naquele Menino que crescia no ventre, dando Luz, provocando exultações de alegria. Apesar das agitações da incompreensão dos modos de Deus a fazer as coisas, já se cumprem as profecias: o Menino traz Paz. 

Voltando a Miguel Torga, já que toca na passagem do Evangelho de S. Lucas que sempre nos acompanha nesta noite, retenho-me no “estábulo”. A frase do Evangelho é muito curta: “Envolveu-O em panos e deitou-O numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na hospedaria”. Jesus nasce no silêncio da noite e afastado de todas as pessoas. Maria nem sequer podia ser acompanhada por José. Não era permitido aos homens assistir ao parto. Imagino esse silêncio, depois de toda a agitação vivida ao longo dos nove meses. Maria dá à luz a Luz. A noite torna-se aurora de nova esperança. Mais um passo na profecia: “o povo nas trevas viu uma grande luz”. Esta noite vive-se nova criação. O caos, as trevas, dissipam-se e vive-se a Luz no Menino Deus. O Verbo fez-se carne e habita entre nós. Monta a sua tenda em cada uma das nossas histórias.

Então, o estábulo, a gruta, desde esse dia deixa de ser um lugar lá, em Belém, para poder ser cada um de nós. N’Ele podemos colocar todas as nossas dores, para se tornarem de parto e assim geradoras de vida. N’Ele podemos colocar todas as nossas alegrias, ampliando assim o ânimo a dar uns aos outros. N’Ele podemos celebrar como os pastores o fim do medo, porque a Vida por, com e em Deus tem sempre a última palavra. 


Permitamos, com toda a liberdade que Deus nos dá, que o Menino nasça na nossa Vida. Afinal, Natal é deixar acontecer a vontade de Deus para o Filho, em ser um connosco. Se tal acontece, tudo muda, tudo transforma, o mundo deixa de ser o mesmo. E sim, esta data torna-se sagrada, em especial cada vez que cada um de nós permite nascer a Luz e a Paz nos nossos corações. Para quê? Para que a essa mesma Paz, essa mesma Luz, em sentido de comunhão e Vida possam, de facto, transformar todo o ódio em amor. Esse é dos grandes desafios de Natal nas nossas vidas. Acontecendo isso, divinizamos a humanidade e cantamos, em alegria, com os anjos: “Glória a Deus nas alturas e paz na terra em toda a humanidade por Ele amada.” Ámen. 

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Em preparação de Natal




[Erri de Luca, “En nombre de la madre”, p. 85]

[Em preparação para a beleza do Nascimento que tudo mudou, que tudo muda]
- Eu desenrasco-me, aqui estarei muito bem. Encontraste um lugar adequado, quente e tranquilo. Eu desenrasco-me, José, sou mulher para isto. Ao amanhecer ponho-te Jesus ao colo.

As dores tinham começado. José colocou um pouco de palha sobre umas pedras secas, estendeu por cima uma manta e peles. Pedi-lhe a faca e uma bacia de água. Deitei-me. O coração latia com mais violência, os latidos ressoavam nas têmporas, como para fechar os olhos. Ninguém à minha volta, o pequeno estábulo estava fora, nos campos. Uma luz caía desde a abertura do tecto de canas e ramos. Era ele, o cometa, posto no céu como um luzeiro. Antes de nos separarmos, passei-lhe a mão pelo cabelo, sorrimo-nos. 

domingo, 23 de dezembro de 2018

¡Gracias, Nacho!




[Breve partilha ante a partida de um Companheiro muito especial e importante na minha história de vida, em geral, e vocacional, em particular] Natal e Páscoa juntam-se. Vives essa fusão, tu que a muitos ajudaste a encontrar a Luz e o Sentido em Deus. ¡Gracias, Nacho, muchas gracias por tu mirada de Vida! Sigue, te pido, ayudándonos a alcanzar la Luz, ahora junto del Señor que tanto has amado.

sábado, 22 de dezembro de 2018

Visitas




[Secção pensamentos soltos, no seguimento das passagens do Evangelho deste tempo de preparação para o Natal] Maria exulta em Magnificat depois das visitas. O Anjo vem até Ela. Ela segue sem demora até Isabel. Êxodos: de Deus e da Humanidade. O exercício de sair é dos mais exigentes. Sair do acessório para o essencial, quero dizer. O grito de humildade, no reconhecimento da beleza de quem se é, implica muitas travessias de montes e vales da história, pessoal e universal, entre silêncio e multidões. É a busca do ajustado, na força da palavra que derruba poderosos e alimenta famintos. Deus torna-se pequeno, muito pequeno, para anunciar o fim dos holocaustos desprovidos de amor. Maria tem consciência dessa nova Verdade. Sente na pele o ser apontada como potencial adúltera, enquanto é protegida pela fé de José. O Filho que leva no ventre dá-lhe a Esperança do Mundo Novo a acontecer, que unirá plenamente céu e terra. Essa Esperança transmite na saída de si, na visita que faz, na certeza de ser habitada pela Palavra que é Justiça e Paz.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

Anunciação




[Secção pensamentos soltos] O encontro de Gabriel com Maria reveste-se de solenidade. Não da pomposa, mas da silenciosa. Relendo o evangelho de hoje, a Anunciação, apercebo-me dessa presença do Senhor nas nossas vidas. É certo que a saudação é dirigida em particular a Maria. Contudo, fazendo ponte com a Criação, o ser humano ao receber o alento divino torna-se participante da vida divina. Que significa isto? Nessa anunciação que de algum modo é dirigida a cada pessoa. Dar vida, dar a vida é do mais complexo que há. Não se reduz a um simples altruísmo natalício, mas a cada gesto de quotidiano que se dirige ao outro. Em cada Natal fico a pensar no que significa “nascer de novo”. Serão gestos que aprofundam a autenticidade da existência? Maria, de algum modo, é convidada a abrir os horizontes. Depois do recolhimento do encontro, viverá em constante saída, que, no seu caso, poderia mesmo implicar a fatalidade de perder a vida. A Anunciação, que cada pessoa é chamada a viver, é de abertura de horizontes, de saída de uma aldeia para a universalidade do mundo, que é e será sempre vasto. Daí a solenidade deste encontro, sem pompa, mas com a profunda autenticidade que leva à transformação do que significa humanidade.  

domingo, 16 de dezembro de 2018

Breve Oração




[Breve oração antes de adormecer]

Agradeço-Te 
a Luz que desvela silêncio e a certeza da Tua alegria primeira por cada vida.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Corpo com integrador



Guillem Jové

[Coisas na vida de um padre] “Educar para a razão e a emoção: o corpo como integrador”, foi o meu tema. Depois falou Maria Ángeles Guiteras, com enfoque na psicologia. O debate seguinte foi muito animado, tal como as conversas no final. Há muito interesse nos temas de corpo. Muito mesmo! 

Simpósio Internacional




[Coisas na vida de um padre] Hoje o dia é por aqui, em estreia como orador convidado no Simpósio internacional “Razão e emoção: sociedade, política e religião”, organizado pela Fundação Joan Maragall - Barcelona.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

Testemunho para a Câmara Municipal de Portimão




[Coisas na vida de um padre] A Dra. Isilda Gomes, Presidente da Câmara Municipal de Portimão, convidou-me a estar presente na sessão solene comemorativa do Dia da Cidade e a dar um testemunho sobre o voluntariado, em especial, a propósito do incêndio na Serra de Monchique. Foi ontem. Isto de estar quase no pólo oposto do país impossibilitou-me de ir pessoalmente a Portimão. No entanto, enviei um vídeo com o meu testemunho. Como algumas pessoas pediram o acesso ao vídeo, aqui o partilho. 

[Vídeo e edição por Vasco Martins, nosso aluno da OFICINA - Escola Profissional do INA.]

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Natureza



[Secção outros tons] A natureza, em espera de tempo certo, ensina o equilíbrio. Movimenta o silêncio. Abre as cores. Desvela mistério. Sem refúgios, é. Simplesmente é. Aí reside a grande maestria divina. 

"Não basta?"



[Secção boas leituras] Assim, para começar a semana em que terminam as aulas e aumentam as azáfamas natalícias. Almada Negreiros, “A Invenção do Dia Claro”, p. 11.

sábado, 8 de dezembro de 2018

Palmas




[Coisas na vida de um padre] Chegaram registos de momentos felizes. “Palmas, amigos! Palmas! Eles estão casados!”

terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Crónica de Henrique Raposo




[Secção "Deus como Tu"] O Henrique Raposo partilhou comigo o esboço desta crónica no dia em que as lágrimas despontaram por vários momentos. Disse-lhe isso. Fico-lhe muito agradecido pela partilha, pela consideração e palavras sobre "Deus como Tu" nesta crónica, que vem na sequência de outra, sobre isto de educar o rapaz, o adolescente, o homem para as lágrimas.

domingo, 2 de dezembro de 2018

Advento




[Secção pensamentos soltos acompanhados de letras verdes] Gosto do Advento. Há um silêncio próprio que se impõe: o da espera, permitindo preparar o coração para o encontro que um dia iluminará todas as relações. A espera de Advento amplia-se em esperança. Em dias de luto, onde é necessário dar tempo à transformação da relação, deixo ecoar a vida no coração. E agradecemos muito, os meus pais e eu, os abraços recebidos envoltos de luz.