Teresa e Dado | Arte Magna
[Secção conversas soltas, com a devida licença para partilhar]
- É tão difícil falar disto.
- Tome o seu tempo.
[Silêncio]
- As pessoas acham que é simples. [Silêncio] Mas dói muito, depois do físico, na alma. [Silêncio] Vivi dois abortos. Dois meses e três meses. Depois de muitas expectativas, conseguimos engravidar. Há algo de profundo que acontece. É uma felicidade que não se explica. Sentia-me cheia de vida. Depois, uma dor horrível. É horrível. [Emociona-se.] Queremos guardar segredos, mas é difícil quando a notícia é tão boa. E quando se conta a outra notícia, ouvimos: “era o que tinha de ser”, “dá graças a Deus, talvez não fosse perfeitinho e encarregou-se de o levar”, “vocês são novos, já conseguem outro”, “menos mal que já têm um”, “há quem esteja pior”. P. Paulo, desculpe-me, mas as pessoas são parvas, não são? Perdem a noção? E a minha dor?
[Levanto-me.]
- Posso dar-lhe um abraço?
[Abraçamo-nos. Vem o choro profundo.]
- Dói tanto! É um vazio horrível!
- É um luto. Não se pode desvalorizar.
- Foram duas vezes.
- Ainda mais. Que dores violentas, física e emocional.
- E nós, mulheres, somos consideradas o sexo fraco. Fraco? Desculpe-me P. Paulo: f*da-se!
- Isso, deite a raiva e zanga cá para fora.
- Não se ofenda, desculpe.
- Fico ofendido se continuar a pedir desculpa por estar a libertar essa dor. É mesmo para dizer um real F*DA-SE!
- Obrigado! [Emociona-se]
- Há gritos que têm de ser dados. É a perda de dois filhos.
- E há tanta incompreensão nestas dores.
- Que têm de ser acolhidas. Quem não sabe o que dizer, mais vale ficar calado. Todas as dores de alma têm de ser respeitadas e acolhidas, para poderem ser aliviadas e integradas.
- Talvez possa ser estúpido, mas posso pedir-lhe para celebrar missa por eles?
- Não é estupidez nenhuma. Faz-lhe sentido?
- Muito.
- E se for com as pessoas que para vocês, família, são próximas?
- Agradeço-lhe de coração.
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