segunda-feira, 6 de setembro de 2021

A Vida é




Madalena Meneses


[Secção conversas soltas condensadas, com a devida licença para publicar, nestes dias de julgamentos em praça pública sobre temas tão complexos da vida humana]

- P. Paulo, das coisas mais terríveis é ter de chegar a casa e pôr a máscara. Quem diz casa, diz também igreja ao Domingo com família, para manter as aparências da família feliz. Fica bem. Estou farto do “fica bem” e não me consigo libertar disso. Fala-se muito em sociedade de emancipação, de saída do armário, de tanto, mas não se conhecem os meandros psicológicos e espirituais provocados pelo que se ouve desde quase o ventre materno. É mais fácil uma vida dupla e, mesmo sendo terrível, chegar a casa e pôr a máscara. Ir à Missa e pôr a máscara. Quem sou eu? [Com a pergunta as densas lágrimas surgiram.]

Levantei-me e diante coloquei a minha mão no ombro, mantive o silêncio, deixando falar o gesto firme de acolhimento. Quando serenou, regressei à cadeira. Seguiu: sou o filho que vê a mãe a chorar depois do pai gritar. Sou o irmão que vê os mais novos começarem a seguir caminhos extremos ao nível político e religioso. Sou o amigo que se isola cada vez mais. Vale a pena viver?

- Que resposta tem para essa pergunta? 

Fixou-me o olhar.

- Como assim?

- Do imenso que me conta, é como se encontrasse um muro intransponível e, de algum modo, se começasse a identificar com esse muro. Pode fechar os olhos? Respire fundo. Volte a abrir. Diga-me: vale a pena viver a sua vida ou a de outros? Sei que a sociedade, a família, até mesmo a religião, obriga, paradoxalmente nalguns campos no aparente em nome da liberdade, a viver a vida que outros querem, seja em massa amorfa de características, seja em individualismo fechado da sociedade. Descobrimos a nossa vida, na relação tu-a-tu connosco e com Deus, é extremamente exigente, mas é também aí que se começa a desvelar a resposta à tão séria pergunta de “quem sou”. O caminho é longo, mas não impossível de percorrer. E vai precisar de ajuda espiritual, sim, mas igualmente psicológica, de modo a dialogar com as máscaras sem as julgar. 

- Aconselha-me alguma leitura?

- “O caminho menos percorrido” de Scott Peck. A primeira frase: “A Vida é difícil”. Depois, é abrir-se à riqueza e sentido da sua vida.

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