[Secção coisas de corpo no dia da Ascensão] Sempre me incomodou quando alguém insiste fazer algo que a outra pessoa não gosta. Por exemplo, tenho muita dificuldade, dor mesmo, quando alguém me bate nas costas. Uma vez fizeram isso e avisei que não gostava: “oh, não gostas de cumprimento à macho?” Prefiro cumprimentos humanos. Mas recordei outras vezes que assisti não a cumprimentos, mas a gestos aparentemente de macho: as “arróbadelas” às raparigas. A brincadeira de as apalpar como demonstração de virilidade. Uma vez, já com medo presente, manifestei-me contra apenas com a reacção facial. Ouvi: “que cara é essa? Não gostas? Não és homem? Ah, a menina apoia as meninas. Maricas de merda!” Mais medo tive, ainda veio o empurrão em conjunto.
Sei hoje, por muita formação, leitura, estudo, silêncio, ajuda espiritual e psicológica que o trauma não é fácil de desbravar. Leva tempo a falar. Anos, décadas. Mas é possível! Ainda há muitas pessoas com dificuldade em verbalizar as dores sentidas pelas violações da dignidade com as apalpadelas e mais que isso. É preciso muito respeito e compreensão na escuta, até mesmo para acolher a possível distorção de memória que é natural surgir. Para que se comece a dar espaço à libertação do trauma, é preciso que se fale de forma pública, sim. Sobretudo para ajudar a mostrar que não se está sozinho(a) no sofrimento e assim possa procurar a ajuda necessária. Mas é importante que se fale de forma sensata, clara, sem apelar ao emotivismo, pois muito ruído também pode provocar mais fechamento.
Na Ascensão, Cristo leva a nossa humanidade para o céu. Aí está o corpo, a carne, com a sua força e fragilidade. Deus conhece o ser humano plenamente. Mas porque nos quer adultos, nas muitas dimensões, desafia-nos a fazer caminho de maior respeito por cada pessoa para que também nós possamos ascender com Ele. Quando alguém insiste em fazer mal a outra pessoa de forma verbal, psicológica ou física contribui para dificultar a vida plena. Ainda assim, vale-nos a certeza de que Ele inspira pessoas que se vão libertando do medo e são capazes de impedir que mais sejam maltratadas na sua dignidade, também enquanto corpo.
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