domingo, 13 de outubro de 2019

Curar | Sanar




[Secção pensamentos soltos] Há curar e há sanar. Há quem fique curado e nunca sanado. Há quem possa não ficar curado, mas sana profundamente o Ser. É o eco que me sai da passagem do Evangelho para hoje. Jesus cura dez pessoas com lepra. Apenas uma, curiosamente um estrangeiro, um samaritano, regressa e agradece. A fé, diz-lhe Jesus, salvou-o. Além de curado, ficou sanado. Sanar é o reconhecimento do tanto bem recebido. É necessária a distância que permita esse reconhecimento. Quem já fez a experiência de uma ou mais viagens, da saída a outras perspectivas de terras, culturas, pensamentos, sentindo outros cheiros, sabores, línguas, emaranhando-se, por exemplo, no não entender bem o que está a ser dito, levando à humildade de algo novo em si, percebe a transformação que acontece na vida. Há muitas coisas que são precisas curar, mas o grande desafio da vida é sanar profundamente o Ser. Para isso, é preciso sair, abrindo o coração em atitude de agradecimento, e dar passos de encontro. De algum modo, todos somos estrangeiros, estando fora da terra que a todos une. Isso tem causado divisões, ataques a cores de pele, a modos de falar, em conjunto com desprezo fácil a quem, por exemplo, é crente em Deus. Também o despontar de ora patriotismos exacerbados, ora tentativas de diluições de identidade numa neutralidade ou igualitarismo animal impossíveis de acontecer. Tudo isso desgasta. Aumenta lepras socias, onde partes de corpo apodrecem, impedindo a colaboração e a integralidade da comunidade na sua diversidade. Por isso, é necessária a distância, onde se é capaz de reconhecer que ninguém é absoluto e, com objectividade, encontrar a relação que humaniza. Atravessamos muitas feridas sociais. Se cada pessoa conseguir perceber onde precisa ser curada, mas, mais que tudo, sanada, não só a própria sociedade se vai curando, como encontra sanação. Afinal, a nossa fé, alicerçada no reconhecimento em Bem do outro, é capaz de salvar.

Sem comentários:

Enviar um comentário