Prandoni Livio
[Secção desabafos] Actualmente vive-se de polémica em polémica. As redes sociais, com os seus algoritmos, ajudam. As polémicas tornam-se virais. De uma passa-se a outra, esquecendo-se a anterior. E assim de impulsos, ao jeito de explosão de chama de fósforo, vai-se vivendo… rasgando-se vestiduras em meia dúzia de palavras irreflectidas em comentários agressivos. No final, não se chega a ir ao fundo do(s) problema(s). Talvez não se queira, não dá jeito, é demasiado incómodo, a precisar de mais tempo que apenas de um clique de “like” ou “partilha”. Agora fala-se sobre o rapaz das orelhas grandes. Ainda me lembro das vezes que na escola me chamavam de Dumbo. E não era propriamente um elogio. Talvez por isso tenho estado mais atento a esta polémica. Não vou menosprezar o caso, que é de ser analisado com atenção… mais um aliás. O que não gostaria é que, como de costume, as questões de fundo passassem demasiado depressa. Ao jeito de bode expiatório, descarrega-se culpas: neste caso, começa logo a ser no programa. Mas o programa é demasiado abstracto, então, no júri ou às pessoas da produção que lá na régie ridicularizavam em nome do gozo que vai dar audiências. “É coisa que o povo gosta!” Desta vez correu mal, estalando a polémica. A SIC escreve uma carta, vai apoiar a família, porque se vê apertada com a situação e, óbvio, não quer perder audiências. Mas será que vai perder? Afinal, para chegar ao ponto de ridicularizar é porque sabe-se que as audiências dos programas que alimentam a estupidez humana são elevadas. Quanto mais gozo, agressão, ordinarice em gestos ou palavras, melhor. Ah, então a culpa já não é só do programa, ou dos programas, mas também de quem vê, de quem, tornando a sua vida como telenovela, muda os ídolos para pessoas que tem a formação reduzida ao estímulo da polémica. Li que se devia promover mais fiscalização nestes programas e que se devia ter em atenção “a violência da caricatura”. Quando existe formação de valores básicos humanos, por exemplo, de respeito e compreensão, não há necessidade de mais fiscalização, para além da mínima de convivência social. Quanto à “violência da caricatura”, não pude deixar de sorrir. Viva a liberdade de expressão! Ela é fundamental. Isso não significa, como claramente se entende, que tal como qualquer dimensão humana não tenha limites. É difícil regular os limites da liberdade de expressão e muitas vezes esse é o grande problema, mas se houvesse mais formação dos tais valores básicos humanos um dos limites seria, p. ex., o bom senso. Mesmo sendo demasiado subjectivo, o bom senso ajuda a perceber o que é ajustado no respeito ao outro, sabendo-se pôr no respectivo lugar. Enfim, continue-se a menosprezar a educação, a formação humana, o profundo sentido de liberdade de consciência e expressão, alimentando-se a ignorância e o terrível poder que a saberá usar. Pois, isto não é uma questão de orelhas, mas de humanidade.
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