Ruta Balciunaite
Às vezes é necessário pôr a fé em causa, no questionar acertado, tentando tirar as dúvidas que, se não saem, podem ficar a amargurar a alma. Ver para crer, tal como Tomé, pode ser mote para conversão. Tento pôr-me na pele daquele homem: depois da brutalidade dos acontecimentos, dizer-lhe a frio que o Senhor está vivo é de sentir, mais que desconfiança, que gozam com a sua cara. Põe em causa, porque, parece-me, o desejo de encontro ainda lateja no coração. O Mistério não se fecha num granito imutável... surge em caminhos incertos e pode implicar questionar para descobrir o que pode abrir ainda mais horizontes. Há dois anos arrisquei um poema, depois de rezar a famosa passagem do encontro de Tomé com o Ressuscitado. Volto a ele... e nisto retoco a fé.
[Jo 20, 24-29]
Não sei se são contos.
A morte não foi um jogo.
O véu rasgou-se, sim,
mas o corpo,
em tarde eclipsada,
foi acolhido em braços caídos.
O desalento, a cor, o silêncio,
o retumbar da pedra
na escuridão da gruta,
foram testemunhas do fim.
Pedem-me para crer?
Depois de tanto vivido,
estou cansado de fantasmas,
de histórias desencantadas,
de entusiasmos gastos
pelo etéreo sem mundo.
Apenas peço que os sentidos
doados ao nascer
sejam o registo
desta minha forma de fé.
Eu quero crer.
Escuto o meu nome.
Obediente estendo a mão.
No ver toco as marcas
da História viva.
Será paz o que me envolve?
Ou a certeza de que sou atendido
nas preces da agitação?
Creio, Senhor.
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