[Notas soltas muito pessoais em noite de Sexta-feira Santa] Há dias partilhava o quanto me marca o silêncio nesta Semana. Hoje, torna-se quase sufocante, depois do último expiro de Jesus. Enquanto escutava o relato da Paixão, o imaginário já não vagueava apenas em imagens de filmes ou livros, mas, apesar de todas as diferenças, surgiam-me as ruas, vielas, espaços de Jerusalém. Voltei a sentir o impacto daquele lugar, em particular do Santo Sepulcro. Ali, o silêncio da entrega carregada de nomes.
Os últimos tempos têm sido cheios de escuta. Apesar das muitas técnicas e sabedoria para não permitir que as histórias me abalroem a alma, hoje, no momento da adoração da Cruz, vieram-me ao coração quase cada uma delas, em particular as de grande sofrimento, físico, psicológico e existencial. Nós padres, com todos os defeitos que possamos ter, somos transportados para este momento, onde, com a Sua ajuda, também carregamos as dores de tanta gente, juntando às nossas próprias. Ter estado no Túmulo de Jesus ajudou-me a aprofundar a consciência do quanto Ele confia em nós para sermos dadores de vida. É preciso a morte para não nos perdermos no nosso poder. É preciso a morte para perceber que de nada adianta estarmos com mesquinhez de coisinhas de aparente fé e defesa de Deus, levando a segregar.
Apesar disso ainda se continua a gritar crucifica-o nos abusos de todo o tipo. Estamos em tempos que nos rasgam a alma em questões de existência e não estamos a parar para pensar seriamente nisto. Sinto a cruz presente em tanto no mundo. E Ele não desiste de a carregar. Muitas vezes quer-se que Deus arrase com o mal. E Ele fê-lo: tomando-o sobre si e morrendo. Rápido é ripostar. Lento e exigente é amar. E Ele amou.
Nesta noite, em Vigília, volto àquela outra junto ao Túmulo: envolvido de escuridão da morte, na esperança da Vida, peço para sermos Luz, sermos Paz.
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