Uma página de ‘O Livro das Questões’ de Edmond Jabès
[Notas soltas depois de breves momentos de oração] Volto a escrever sobre a noite. Recordo visitar a minha avó Constança, no profundo Alentejo, e ficar de noite à luz de fogo. Apetecia-me voltar com o entendimento de hoje. Ainda assim, voltam-me ao pensamento as imagens das brasas e das labaredas a encantarem-me para mundos distantes. Quase que ouço os estalidos. Quase que vejo fundir-me com a luz na escuridão. Tem sido assim a minha oração. A noite chegou. Não a sinto escura. Mas necessária. É mais uma travessia de purificação, despojando e integrando outros tempos, deixando que Deus me mostre mais um pouco do todo. É necessário. Só assim posso compreender de entranhas o sentido de amar, libertando as ânsias que ainda ecoam de poder ou poderes que desviam o serviço. A noite encerra beleza, da simplicidade, do que é, sem mais nem menos. E há que atravessar a da alma, para perder todos os medos e abraçar o luminoso infinito que me habita, que nos habita. Deus é irresistível. Como estalidos e labaredas de fogo vibrante pela noite.
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