[Secção pensamentos soltos em Quarta-feira de Cinzas] É a primeira vez, em todos estes anos de celebração de cinzas, que sinto profunda vontade em regressar ao pó da terra. Está fora deste meu sentir o fatalismo moralista com que se entende a frase que caracteriza o dia de hoje. Não é um desejo de morte. Muito pelo contrário, atravessa desejo de vida nova. Fui-me cansando da soturnidade dada à Quaresma. Fui-me abrindo à serenidade que estes 40 dias implicam de encontro com Deus. Por isso, este dia de Cinzas ganha luz. Na beleza da criação somos moldeados por Deus a partir do pó da terra. Tanto significado isso tem. Há quietude na terra, que ali está, sujeita às agruras do tempo e de quem passa. A sua fertilidade reveste-se de matéria-morta em húmus transformada. Acolhe a chuva como força aos naturais nutrientes a dar às sementes que nela caírem. Sim, pó da terra. No meio de tanto ruído por esse mundo fora, onde tanta gente rasga as vestiduras em frente a um écran, sem pudor de matar através da palavra, a quietude é desejada e assim viver: jejum do que bloqueia maior autenticidade; silêncio para visitar as sementes e as impurezas, libertando do que impede de doar mais. Regressar ao pó da terra torna-se, então, a certeza de regresso a casa, onde Deus nos espera para o abraço reconciliador, enviando-nos novamente a ser vida para os outros.
quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020
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