[Secção pensamentos soltos] Estamos rodeados de véus. Uns mais evidentes, outros subtis, mas estamos rodeados de véus. Fico a pensar no desafio que é ir dando conta ou nomear esses véus e permitir atravessá-los. Dos versículos que mais me ecoa é o “rasgar do véu do templo” no momento da morte de Jesus. Deus, ou o Santo dos Santos era inacessível, rodeado por um véu. Rasgou-se. Que som igualmente forte quando a palavra é pronunciada. R-A-S-G-A-R. Quando se rasga algo, muitas vezes é sinal de estar gasto. Outras vezes é de pequeno acidente. No entanto, quando rasgamos propositadamente algo, folhas de papel ou fotografias, é outro modo de dizer: já não interessas. É exercício de liberdade. A folha de papel pode ser tantas coisas, sociais, religiosas, políticas, culturais, que, além de se terem transformado em estruturas pesadas, impedindo a leveza da Vida, bloqueiam a passagem. Daí que na oração, para quem é crente em Deus, e na reflexão consigo mesmo, para quem é crente apenas na humanidade, há algo primordial: a verdade a nomear os véus, que podem ser sentimentos, acontecimentos, pessoas, incoerências, medos. Esse processo pode ser muito doloroso, sendo necessário acompanhamento. Não se trata de heroísmo, mais de cuidar-se. Dos momentos mais bonitos que vivo como padre é acompanhar a beleza das travessias na vida. Quando S. Paulo escreve que agora vemos como num espelho, depois será face-a-face, imagino-me para lá de todos os véus rasgados diante do profundo olhar amoroso de Deus rodeado de gente, muita gente na mesma contemplação de Vida.
sábado, 13 de julho de 2019
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