domingo, 16 de julho de 2017

terra




Phuc Auh Huynh

[Secção pensamentos soltos] Este domingo tenho andado com “terra” no pensamento. Além de ter de pensar na homilia, ecoavam em mim outras palavras: racismo, “religio-fobia”, homofobia, intolerância, agressividade, cuidar. Muitas mais, evidentemente, mas, para este texto destaco estas… começando por terra.

Os textos deste domingo apontam muito para a importância da terra, em concreto e em metáfora. Na beleza do mito da criação retratado no livro do génesis, percebemos que o ser humano (em hebraico “adam”) é criado da terra (em hebraico “adamah"). Sim, ser humano, englobando masculino e feminino. A nossa condição tem essa dimensão física/biológica que é transversal a qualquer ser humano, SEM excepção. Biologicamente falando, não temos raça. Durante séculos, foi difícil entender isso, dando importância à cor de pele ou linhagem de nascimento, situando entre a hiper-valorização e a desvalorização. Conforme a cor, havia, bem, infelizmente ainda há seres humanos (adam) que são colocados em patamares de sobre ou sub-humanidade. Repito: adam e adamah.

O Evangelho deste domingo fala-nos em especial do semeador e das sementes. Desta vez, como já se notou, fiquei-me pela terra. Desde o terreno pedregoso e espinhoso até à terra fértil. Até que ponto não temos de perceber que cada um de nós tem um pouco de tudo? Pedras e espinhos que impedem lavrar e bloqueiam a nossa visão de humanidade para além de qualquer característica. E terra fértil, onde sementes deram frutos de respeito e de escuta do outro sem o anular ou matar à partida pela sua diferença de características em relação às minhas. É certo que as minhas pedras e espinhos podem impedir-me de gostar de toda a gente, mas não tenho o direito de os anular. Qualquer fobia, mais ou menos evidente, dirigida a pessoas, traduz uma série de pedras e espinhos que têm de ser, primeiramente amados por ainda fazerem parte de mim, ou seja reconhecer sem julgar, e depois, aos poucos serem removidos de modo a que a terra se torne profundamente humana. Isso é de tremenda exigência, porque obriga a ir ao fundo de mim, conhecer-me, na história pessoal e social, e tomar consciência que tirando todas as características sou da mesma terra do que todos os seres humanos que estão na face da Terra. 


Para mim, enquanto cristão, ainda é mais desafiante. Afinal, Deus no qual acredito “enterrou-se” plenamente. Não acredito num deus etéreo, mas em Alguém que assume a própria criação. Daí que Deus não nos vê, nem escuta, a partir de características, mas a partir do ser total profundo em terra à qual Ele próprio pertence. Deus não separa seres humanos. Se existe algo a separar, tal não é a partir de cores de pele, religiões, estatutos sociais ou orientações sexuais, mas da quantidade e qualidade de cuidado que tivemos connosco próprios e com o próximo. Quanto mais cuidado com a terra, mais sementes brotarão, dando muito fruto. 

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