sexta-feira, 14 de abril de 2017

Silêncio em noite de Sexta-feira Santa




Sanjay Ramani

[Secção desabafos em noite de Sexta-feira Santa] Esta é a noite do silêncio profundo que evoca todas as dúvidas, perguntas, angústias. Deus está morto, afirmou Nietzsche uma vez. Aquele em quem todas as palavras ganhavam cor, na autenticidade que fazia engrandecer a alma, foi estendido na cruz e sepultado em tempo de trevas. Sim, Deus morre na sua humanidade, tomando para si toda a morte, nessa injustiça que só quem ama tudo e todos pode assumir. Durante a celebração da Paixão e na procissão do enterro do Senhor, o meu coração enchia-se de silêncio carregado de gritos. Naquele tempo e nesta noite, vive-se o memorial que faz repetir todos os acontecimentos, juntando todos os gritos que dia após dia voltam a ecoar no mundo que busca sentido e Paz. Faz-se silêncio pelas trevas que envolvem gestos de morte que atacam tantos seres humanos indefesos, na sua fragilidade, condição de deficiência ou idade. Silêncio pelas trevas que buscam escravidão de mãos nas minas de minerais preciosos ou de corpos vendidos ao prazer de tantos que usam e abusam da mulher como objecto sexual. Silêncio pelas trevas dos que são assassinados pela sua fé ou que são postos em Campos de Concentração por serem de condição homossexual e aí serem torturados. Silêncio diante da normalização de bombas que caiem destruindo e matando, sem pudor e vergonha de se usar a palavra “mãe” numa delas. Silêncio diante das imagens de coletes laranjas em barcos pelo Mediterrâneo, de gente que foge da morte. Silêncio diante da falta de Educação, ao nível político e em claques de futebol que desejam a morte a outros, sem respeito pela memória dos que partiram em desastre de avião. A noite é densa por todas as dúvidas, perguntas e angústias. Nós que temos fé, acreditamos em Deus que morreu, de forma indigna, na sua humanidade para nos resgatar, a todos, à Vida. Que esta noite de silêncio nos ajude a, mais que compreender, viver o muito a que somos chamados no caminho da Paz. 

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