segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

A minha Carta de Natal 2012





(Versión en español en los comentarios)

“Em tudo o que suscita em nós o sentimento puro e autêntico do belo, existe realmente a presença de Deus. Há uma espécie de encarnação de Deus no mundo, de que a beleza é testemunho. O belo é a prova experimental de que a encarnação é possível. Portanto, toda a arte de primeira categoria é, por essência, religiosa. (Algo que hoje em dia desconhecemos.)” 
Simone Weil, em A Gravidade e a Graça


Queridas Amigas, queridos Amigos,

Há dias, nas minhas escritas e estudos, escrevi: as palavras têm “corpo”. Tinham em mente a certeza de que quando se escreve de “coração na mão”, as palavras tornam-se verdadeiramente densas, como que um espelho que reflecte não só o sentir, mas também toda a pessoa que as escreve. Tenho para mim que nesses momentos não pode haver mentira, que a verdade mais pura do sentir aflora e torna-se presente. Outra forma ou outro lado da encarnação, diria. Acrescento que quando me refiro ao coração, faço-o no sentido hebraico, em que é considerado como centro não só das emoções, dos afectos, como também do discernimento, do pensar, do encontro com o sentido e decisões da vida. Por isso, escrever de “coração na mão” é escrever com todo o ser.

Em jeito de pequeno ritual, acendo a vela que me acompanha nas orações dos últimos tempos e dou “corpo” a esta carta de Natal de 2012. 

“Onde estás?” (Gn 3,9) Esta pergunta soou-me forte há dias. No contexto em que é formulada, Deus procura Adão, que se escondeu depois de comer o fruto proibido. No entanto, mais do que me sentir procurado por Deus, percebi que a pergunta me levava a ir ao presente, a uma escuta do “aqui e agora”. “Que fazes? Que queres? Que sonhas?”, ramificariam a partir desse estar. Não se trata de um presente que anula o passado e o sentido das coisas. Tem os alicerces na História (seja ela qual for) e, precisamente por esse passado, é vivido de uma forma diferente. Mesmo que ao jeito de ritual familiar se cumpram as tradições, estas não serão iguais. Olho para este ano que passou e é impressionante as mudanças que houve, os acontecimentos que me levaram a uma diferença no meu olhar da realidade, alterando as respostas quanto ao meu estar, fazer, querer e sonhar.

Ofereceram-me um presépio. As figuras não tinham rosto. Gosto muito de presépios assim concebidos. Dá-me a possibilidade de rezar e de alguma forma ser eu a pôr o rosto: meu ou de alguém. Uma das grandezas da Bíblia é permitir entrar nela com a própria vida e sentimentos. Este ano gritei dolorosamente como Job, blasfemei como Moisés, voltei a construir ídolos como o povo hebreu, senti a minha fé ser desafiada como Abrãao, passei por uma conversão como S. Paulo. Se me centrar nas figuras do presépio: encontrei-me com incógnitas como Maria, junto com a consolidação do sim à minha vocação em servir; foram algumas vezes que fiquei “sem chão” perante os desafios pessoais, sobretudo aqueles que me levavam ir ainda mais fundo de mim e confiar... confiar... e confiar, tal como o grande José; e aos poucos deixar-me entrar no “sentir” do Menino. Este “sentir” de quem não conhece nada, nem ninguém, quando nasce, quando descobre outra realidade da Vida, tendo de ser ensinado e aos poucos crescer em todas as suas dimensões como humano.

Uma grandeza (ou pequenez) de Deus é este voltar a nascer. Não porque necessite, mas para que cada ser humano possa fazê-lo também, na simplicidade dos acontecimentos da sua vida. Pode ser fácil ou muito duro, difícil até. Nós crentes, por vezes, acabamos por dizer coisas “bonitinhas”, como se a vida fosse torneada de “luzinhas e fitinhas natalícias” ou, então, carregarmos a força da crise e dos que estão a sofrer muito. Sem dúvida que temos de lutar pela justiça, no entanto, também temos de respeitar e/ou ajudar as pessoas a encontrar o seu caminho pessoal de relação com Deus, que pode não ter nada que ver com a nossa visão das coisas. Dar corpo às palavras também é passar a uma escuta da realidade, percebendo que o “nascer de Deus” pode dar-se onde menos se espera. O Salvador nasceu frágil, numa gruta, e não caiu dos céus, como um deus guerreiro. 

Onde estou? Estou a ver um presépio sem rosto, onde na sua beleza deixo que a presença de Deus se manifeste, de modo que aí ponha os vossos rostos, com todos os sentimentos que possam estar a passar: a alegria do reencontro, ou a tristeza da separação, ou a incompreensão por tanto mal na realidade, ou o sofrimento pelo desemprego, ou o afastamento da Igreja (mais que de Deus) por todos os motivos e mais alguns, ou a força ganha por um desafio ultrapassado, ou o silêncio da solidão, ou o silêncio de quem contempla agradecido(a) tanto bem que recebeu (nos acontecimentos consolados ou dolorosos), ou a angústia do “sem chão” em relação ao futuro, ou a certeza de que apesar de tudo, mas tudo mesmo, é amado ou amada. 

Queridas Amigas, queridos Amigos,

o meu desejo para estes dias de Natal é que tomem consciência da beleza que cada um de nós é, que todas e todos somos “arte de primeira categoria”. Se isso acontece, o belo falará mais forte e a forma como viveremos o ano de 2013 será diferente, permitindo que as encruzilhadas que passamos sejam oportunidades com esperança e humanidade. 

No silencioso, misterioso e belo acontecimento da noite de 24, rezarei por cada um(a) de vocês ao Menino Jesus: pelos vossos sonhos, desejos e necessidades. Neste novo ano que se aproxima, aconteça o que acontecer, para cada uma e cada um peço esperança, serenidade e oportunidades de encontro com o sentido mais fundo do Natal: a Vida!

Um Abraço muito apertado e até breve!
Paulo Duarte,sj

6 comentários:

  1. Mi Carta de Navidad de 2012

    “En todo lo que suscita en nosotros el sentimiento puro y autentico del bello, existe realmente la presencia de Dios. Hay una especie de encarnación de Dios en el mundo, de que la belleza es testigo. El bello es la prueba experimental de que la encarnación es posible. Por tanto, todo el arte de primera categoría es, por esencia, religioso. (Algo que hoy día desconocemos)”.
    Simone Weil, en La Gravedad y la Gracia


    Queridas Amigas, queridos Amigos,
    (esta carta ha sido escrita en mi mejor español, así que os pido que me perdonéis por los errores... ¡Gracias!)

    Hacia días, en mis escritas y estudios, escribí:las palabras tienen “cuerpo”. Tenía en miente la certeza de que cuando se escribe de “corazón en la mano” las palabras se tornan verdaderamente densas, como que un espejo que reflecte no solo el sentir, sino toda la persona que las escribe. Tengo para mi que en esos momentos no puede haber mentira, que la verdad más pura del sentir aflora y se torna presente. Otra forma u otro lado de la encarnación, diría. Añado que cuando me refiero al corazón, lo hago en sentido hebraico, en que es considerado como centro no solo de las emociones, de los afectos, sino del discernimiento, del pensar, del encuentro con el sentido y decisiones de la vida. Por eso, escribir de “corazón en la mano” es escribir con todo el ser.

    En modo de pequeño ritual, enciendo la vela que me acompaña las oraciones de los últimos tiempos y doy “cuerpo” a esta carta de Navidad de 2012.

    “¿Dónde estás?” (Gn 3,9) Esta pregunta me ha sonado fuerte hacia días. En el contexto en que es formulada, Dios busca Adán, que se escondió después de comer el fruto prohibido. Sin embargo, más que me sentir buscado por Dios, percibí que la pregunta me llevaba a ir al presente, a una escucha del “aquí y ahora”. “¿Qué haces? ¿Qué quieres? ¿Qué sueñas?”, ramificarían a partir de ese estar. No se trata de un presente que anula el pasado y el sentido de las cosas. Tiene los cimientos en la Historia (sea cual sea) y, precisamente por ese pasado, es vivido de forma distinta. Incluso cuando en el ritual familiar se cumplan las tradiciones, estas no serán iguales. Miro para este año que pasó y es impresionante los cambios que hubo, los acontecimientos que me han llevado a una diferencia en mi mirada sobre la realidad, alterando las respuestas cuanto a mi estar, hacer, querer e soñar.

    Me han regalado un belén. Las figuras no tenían rostro. Me gustan mucho los belenes así concebidos. Me da la posibilidad de rezar y de alguna forma ser yo a poner el rostro: el mío o de alguien. Una de las grandezas de la Biblia es permitir entrar en ella con la propia vida y sentimientos. Este año grité dolorosamente como Job, blasfemé como Moisés, volví a construir ídolos como el pueblo hebreo, sentí la fe ser desafiada como Abrahán, pasé por una conversión como S. Pablo. Se me centrar en las figuras del belén: me encontré con incógnitas como María, junto con la consolación del sí a mi vocación en servir; han sido algunas veces que me he quedado “sin suelo” ante los desafíos personales, sobre todo aquellos que me han llevado a ir el aún más hondo de mi y confiar... confiar... y confiar, tal como el gran José; y poco a poco dejarme entrar en el “sentir” del Niño. Este “sentir” de quien no conoce nada, ni nadie, cuando nace, cuando descubre otra realidad de la Vida, teniendo de ser enseñado y poco a poco crecer en todas sus dimensiones como humano.

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  2. Una grandeza (o pequeñez) de Dios es este volver a nacer. No porque lo necesite, sino para que cada ser humano pueda hacerlo también, en la simplicidad de los acontecimientos de su vida. Puede ser fácil o muy duro, difícil incluso. Nosotros creyentes, por veces, acabamos por decir cosas “bonititas”, como si la vida fuera rodeada de “luzitas y cintitas navideñas” o, entonces, cargar la fuerza de la crisis y de los que están sufriendo mucho. Sin duda que tenemos de luchar por la injusticia, sin embargo, también tenemos de respetar y/o ayudar a las personas a encontrar su camino personal de relación con Dios, que puede no tener nada que ver con nuestra visión de las cosas. Dar cuerpo a las palabras también es pasar a una escucha de la realidad, percibiendo que el “nacer de Dios” puede darse donde menos se espera. El Salvador ha nacido frágil, en una gruta, y no cayó de los cielos, como un dios guerrero.


    ¿Dónde estoy? Estoy a ver un belén sin rostro, donde en su belleza dejo que la presencia de Dios se manifieste, de modo que ahí ponga los vuestros rostros con todos los sentimientos que puedan estar a pasar: la alegría del reencuentro, o la tristeza de la separación, o la incomprensión por tanto mal en la realidad, o el sufrimiento por el paro, o el alejamiento de la Iglesia (más que de Dios) por todos los motivos y más algunos, o la fuerza ganada por un desafío superado, o el silencio de la soledad, o el silencio de quien contempla agradecido(a) tanto bien recibido (el los acontecimientos consolados o dolorosos), o la angustia del “sin suelo” en relación al futuro, o la certeza de que, a pesar de todo, pero todo, es amado o amada.

    Querida Amigas, queridos Amigos,

    mi deseo para estos días de Navidad es que tomen conciencia de la belleza que cada uno de nosotros es, que todas y todos somos “arte de primera categoría”. Si eso acontece, el bello hablará más fuerte y la forma como viviremos el año de 2013 será diferente, permitiendo que las encrucijadas que pasamos sean oportunidades con esperanza y humanidad.

    En el silencioso, misterioso y bello acontecimiento de la noche de 24, rezaré por cada uno(a) de vosotros(as) al Niño Jesús: por vuestros sueños, deseos y necesidades. En este nuevo año que se acerca, pase lo pase, para cada una y cada uno pediré esperanza, serenidad y oportunidades de encuentro con el sentido más hondo de la Navidad: ¡la Vida!

    ¡Un abrazo muy fuerte y hasta pronto!
    Paulo Duarte,sj

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  3. Querido Paulo

    não imaginas como te agradeço esta tua reflexão, partilha, dádiva de Natal a partir dessa grande pergunta "Onde estás?"
    Ajudou-me a rezar, partir para esta visitação aos meus tempos, sentimentos e lugares e abre-me perspetiva para o tempo que coemçaremos a contar dentro de dias como novo ano.
    Que orgulho sinto neste algarvio "quase quase" jesuíta tão genuíno e inteiro. Tão bonito por dentro e por fora.
    Um abraço e que Deus te vá sempre revelando a beleza da Vida

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  4. Querida Eva,

    Muito obrigado pelo carinho, amizade e oração.
    Fico mesmo contente por saber que a Carta ajudou a rezar e a ir ao encontro de novas perspectivas.

    Um grande Abraço, assim, "apertadinhe come a génte gósta cá nos Algárves". ;)

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  5. "Aconteça o que acontecer"... tudo acabará bem! ;)
    'Brigado, Paulo!
    ABRAÇO!

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  6. That's it, João! ;)
    ABRAÇO!!

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