domingo, 16 de setembro de 2007

Ainda no registo do amor...



Foto: Isabel Gomes da Silva




O meu amor não cabe num poema – há coisas assim,

que não se rendem à geometria deste mundo;

são como corpos desencontrados da sua arquitectura

ou quartos que os gestos não preenchem.


O meu amor é maior que as palavras; e daí inútil

a agitação dos dedos na intimidade do texto –

a página não ilustra o zelo do farol que agasalha as baías

nem a candura da mão que protege a chama que estremece.


O meu amor não se deixa dizer – é um formigueiro

que acode aos lábios como a urgência de um beijo

ou a matéria efervescente dos segredos; a combustão

laboriosa que evoca, à flor da pele, vestígios

de uma explosão exemplar: a cratera de um corpo,

a levantar-se, deixa sempre na vizinhança de outro corpo.


O meu amor anda por dentro do silêncio a formular loucuras

com a nudez do teu nome – é um fantasma que estrebucha

no dédalo das veias e sangra quando o encerram em metáforas.

Um verso que o vestisse definharia sob a roupa

como o esqueleto de uma palavra morta. Nenhum poema

podia ser o chão da sua casa.


Maria do Rosário Pedreira

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