(Versión en español en los comentarios)
A Compañía Nacional de Danza (CND) daqui de Espanha iniciou uma campanha de sensibilização para a dança. Uma fotografia de cada pessoa, acompanhada da frase “le gusta la danza. ¿Y a ti?” (“Gosta da dança. E tu?”). Sabia que iam fazer esta campanha. Foi em Janeiro, aquando da primeira apresentação da CND com a nova direcção artística de José Carlos Martínez. No intervalo estavam a fotografar pessoas do público em geral. Também me fotografaram. Sei que o meu gosto por esta campanha também tem o seu lado subjectivo. No entanto, como não sei se me seleccionarão para aparecer na campanha, devo dizer que gosto mesmo desta ideia de relacionar o público com a arte, neste caso a dança.
Qualquer forma de arte sem público não tem sentido. O acto criativo, mesmo não tendo que estar focado no público, tem de o considerar. A questão não se prende em “vão gostar ou não”, mas como forma de dar algo, de promover uma relação. A criação é exteriorizada numa entrega, numa partilha. Pintar, esculpir, coreografar, dançar, compor, escrever, para ficar fechado é apenas uma idealização do processo criativo e não uma realidade artística. O acto de publicar confere a saída do tempo e do espaço do criador, dando-lhe uma nova abertura.
Quando vi as coreografias apresentadas pela CND em Janeiro, sabia que havia uma tensão no ar. Nacho Duato esteve anos à frente da CND e agora entra um novo director artístico. O que irá acontecer? Nova linha? Mudanças? O pouco que estava dentro do assunto restringia-se ao que havia lido sobre o tema, antes de ver as peças. Percebe-se então que há uma espera da reacção do público. O que dirá quem vai assistir? Com esta campanha há um convite claro da participação do público a ver, a saborear, a entrar na dança, reagindo a tudo isso. Também eu recordo o que senti.
Entrei no Teatro Zarzuela e caiam penas no palco. Para mi, a clara sensação de, mesmo estando a entrar, já estar a acontecer algo. A preparação já é acção. E a primeira coreografia já estava, de alguma forma, em marcha. Não temos a presença dos bailarinos, mas temos o cenário que já nos informa, do que entendi depois, da leveza de Extremely close, de Alejandro Cerrudo. Segue-se El espectro de la rosa, de Angelin Preljocj, Artifact II, de William Forsythe, terminando com Walking Mad, de Johan Inger.
Como alguém do público, fora do que senti e vivi em cada coreografia, a grande sensação foi: a CND quer apresentar algo novo, sem ter uma linha para além do: “Desde que seja bom, apresentamos”. Todas as coreografias eram bastante diferentes entre si e num dos intervalos houve o recordar da História da CND. Passado, presente e futuro.
O que mantém em comum tudo isto? A realidade do público. O público não é uma abstracção. São pessoas que sentem, vivem, aplaudem, criticam, soltam gargalhadas, choram e que de alguma forma afirmam que a arte é vida e não pode morrer. Em tempos de crise é fácil eliminar a arte, como se de um luxo tratasse. É verdade que as entradas são caras e não se pode ir a tudo. Mas não podemos esquecer que os artistas não vivem do ar e que entrar no mundo da arte é também entrar no mundo do humano. A arte permite uma relação com a humanidade, um vínculo que dá outra dimensão da vida. O que seria um mundo sem música? Sem pintura? Sem dança? No fundo, sem cultura? Sem dúvida que seria um mundo mais desumanizado.
A arte precisa do público e o público precisa da arte. A arte é um dos cumes do humano: a capacidade de abstracção e de acolhimento dos sentimentos que surgem nesse momento. Fazer o “desenho” da vida, em movimentos, pinturas, música. A arte, em si, não é um capricho, é uma necessidade humana, porque nos afecta. Podemos ter com que comer e beber, junto com um tecto, mas só com isso não somos felizes. Há necessidade de mais. O afecto, o vínculo, a capacidade de desenvolver uma relação abre as portas: da imaginação, da Vida que quer dar vida e respeito pelo outro, do artístico e, sim, da Fé. E isso é Ser Humano.
Parafraseando a campanha da CND: Sim, Gosto da Arte.
Afinal, a arte também é o público e o público também é a arte.
P.S. - Este sábado, 21 de Abril, quem possa, não perca o II Fé e Arte, em Braga. Mais informações em www.fe-e-arte2012.com