terça-feira, 28 de junho de 2016

Há um ano




Esta foto foi tirada há precisamente um ano. Foi a última, de muitas, que tirei à Torre, quando estava a regressar a casa para terminar de fazer as malas e arrumar o quarto. Tanto aconteceu desde há um ano, nesse regresso a Portugal depois de 5 anos fora a estudar. Há pouco, na Missa, recordava bem esse dia carregado de emoção. As despedidas são sempre estranhas, junto com a vontade de (re)encontros. Também a chegada à nova Missão, no conhecer tantas pessoas que se foram tornando importantes. A vida de jesuíta tem este quê de partir, chegar, re-partir e… o coração vai-se enchendo de pessoas, histórias, amizades e conversões. E, amanhã, em dia de S. Pedro e S. Paulo, nesse aniversário de regresso, viajo em visita de estudo até Madrid e depois, com outro grupo da escola, sigo para Loiola e Xavier. É isso, partir, chegar, re-partir… 

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Amamentar




Alex Midura /Reuters

[Secção coisas de Corpo] Tem acontecido, quando há celebrações por aqui, de me pedirem para usar o meu gabinete para amamentar. Aparentemente por ser um local resguardado para a criança. Mas, não, engano! É por ser um local resguardado para os outros… em especial os que sentem incómodo, até mesmo nojo, de ver a “cena”, ou seja, o conjunto mama e bébé a mamar. Como é possível que se tenha de resguardar, fugir, de olhares e comentários reprovadores, até para uma casa-de-banho (que sítio para comer!?!?) para viver algo de tão natural que é alimentar uma criança? Esta coisa de puritanismo corporal faz-me alguma confusão, ainda mais quando nos referimos ao básico: tipo, somos mamíferos! “Ai, padre Paulo, mas a senhora tem de tapar o seu peito [vulgo, mama], por ser indecoroso!” Indecoroso é a falta de respeito na forma como as mulheres são destratadas também por terem de se esconder para alimentar as suas crianças. Isto de ensiná-las a estar à mesa é só a partir de uma certa idade. Antes, não escolhem nem hora, nem local, para comer. Têm fome e pronto. Quem tem rasgos de puritanismo e pudor excessivo com a mama alheia, abra um pouco mais os horizontes, estudando e conversando sobre, por exemplo, o profundo significado da relação, do vínculo e do afecto mãe-criança que se estabelecem nesses momentos únicos.

domingo, 26 de junho de 2016

Recordações




[Secção Memórias] E de repente, a ver algumas fotos de um grupo de Alcafozes, uma pessoa voa até aos primeiros dias de Setembro de 2003 e, depois, Agosto de 2014. Ambos anos com boas memórias… da mudança de Companhia (da aérea para a de Jesus) à celebração da Missa, no ano em que fui ordenado, em honra de N.ª Sr.ª do Loreto, em Alcafozes. Meia-volta, os aviões, a farda, os voos e, sobretudo, os amigos “voadores”, lá vêm avivar as boas recordações. Vuuuuu…. ;)





sexta-feira, 24 de junho de 2016

Resultados





Emanuele Toscano

Haverá sempre tensão entre o abstracto das instituições [sociais, políticas, religiosas] e o concreto do quotidiano. Diminui, quando quem decide conhece a “realidade-real”, para além da “realidade-de-papéis-com-números-e-ideias-soltas". Aumenta, quando a ignorância ganha terreno. Os resultados andam à vista. E, tristemente, os extremos ganham ânimo.



quinta-feira, 23 de junho de 2016

Movimento e gesto




Gal Gross

Estava a rezar e a apercebi-me do impressionante ruído que me envolvia. Queria falar a Deus de muitas situações, sem saber por onde começar. A angústia subtilmente ganhava terreno. Comecei a dançar e deixei que o corpo revelasse através do gesto cada uma das situações e pessoas que tinha em mente. O corpo em movimento abriu as portas e as janelas à serenidade. Da mente, passaram para o coração. Aos poucos, os gestos foram ficando mais lentos, permitindo ambos corações dialogar. Aproximou-se o silêncio e, nome após nome, entreguei as vidas.


quarta-feira, 22 de junho de 2016

Fronteira(s)



Christian Fernandez


[Secção outros tons] A fronteira não delimita o dentro do fora ou o fora do dentro. Para uns, necessidade de ficar confortável no adquirido, para outros, simplesmente o não abandono nas mãos do medo e possibilidade, apesar dos riscos, de transformação da sobrevivência para a Vida.

quinta-feira, 16 de junho de 2016

Vida(s) em partilha




Momento da primeira Comunhão de algumas crianças, filmado por Marta e Tiago

Muitas vezes têm-me perguntado de onde vem este meu modo de ser. Em resposta rápida e limpa, seria da Relação. A seguir teria de acrescentar com quem, o que levaria a uma extensão imensa, por exemplo, de pessoas mais ou menos próximas em tempo e espaço.

Também comentam que sou diferente. Sim, sou diferente, porque tenho encontrado tantos e tantas diferentes que me inspiram. O primeiro é Cristo. Depois, muitos crentes (com destaque para inúmeros companheiros jesuítas, padres e outros imensos amigos de perto, de longe) e não crentes (em maior ou menor amizade, mas com profundo sentido de humanidade). Sou diferente, pois também, além de ter perdido o medo de conhecer-me e amar-me nas luzes e sombras, como cristão, em particular como padre, tenho tido a oportunidade de conhecer a grandeza do coração humano, quando, de livre e espontânea vontade, tantas pessoas sentem confiança em partilhar comigo as suas entranhas.

De igualmente salientar que nas minhas amizades, sérias, daquelas que se partilha profundidade de vida, há gente de muita diversidade social, cultural, nacional, política, artística, intelectual, religiosa, etc, com quem tenho tido conversas que me obrigam a ver outras perspectivas. Se venho a concordar, a discordar, a aceitar ou a tolerar os pontos de vista, é outra história, mas sei que faz parte do caminho que desejo no percurso de humanização.

Graças a estas amizades, juntando as leituras e a escuta que vou tentando fazer da realidade, vai crescendo a consciência da complexidade em que vivemos. Por isso, apercebo-me também do difícil trabalho que é compreender o outro. Isso não significa aceitar tudo, junto com o não mergulhar em generalizações em que se arruma tudo no mesmo armário, caixa, esquema, etc.. Reconheço que, como cristão, em particular como padre, sinto muitas dores de alma: por viver, sim, o jugo de uma história e actos que merecem muitos pedidos de perdão; por acompanhar vítimas de tanta estupidez e barbárie, resultado de péssimas interpretações do Evangelho, que promovem mais a condenação que a salvação; mas também por ver-me incluido em rótulos de injustiça. Claro que poderia ser muito pio e regozijar-me em estar a “ser perseguido” como diz o Evangelho. No entanto, não me regozijo, precisamente pela complexidade, em que, por exemplo, essas perseguições são também fruto de outras tantas promovidas, ao longo dos tempos, pela minha família religiosa mais ampla. Mas seria injusto da minha parte, se não mencionasse o imenso Bem, discreto e silencioso, que esta minha família, Igreja, faz por esse mundo fora, continuando em caminho de conversão e busca da entrega e serviço. Há tanta falta de clareza nesta complexidade, que tem muito pouco de neutra e está recheada de matizes, de tons e de sons. Por isso, é necessário paragem, silêncio, oração ou pensamento, escuta, reflexão, para não terminarmos todos cegos, mancos, surdos e mortos… de humanidade.

Nestes últimos dias tenho escrito, pensado e rezado sobre o ódio e sobre a força do Amor. Faz tanta falta tomar consciência do Outro, sem que tenha de partilhar imediatamente do que se pensa, diz, faz, é. Se se quer contribuir para o tal “mundo melhor”, há que sair, descentrar, abrir horizontes… pôr-me rosto-a-rosto, sem complexos de superioridade, seja mais ou menos conservador ou progressista. Há dias, Rui M Pêgo, na sua página do facebook, escrevia, em resumo, num texto viral com mais de 38 mil “likes” e mais de 4800 partilhas, para que não rezássemos por Orlando, mas que tratássemos os outros com o respeito com que gostaríamos de ser tratados. Parafraseou a milenar Regra de Ouro, transversal a todas as culturas, como algo simples. Simples, é. O desafio em torná-la prática e viva tem que ver com a exigência do reconhecimento das luzes e sombras que todos vivemos. É que isto de transformar o coração de pedra em carne é trabalho de vida, com necessidade de algo fundamental e inerente à condição humana: a relação que humaniza e transforma o modo de ser.

quarta-feira, 15 de junho de 2016

"Amar os inimigos"




Davorin Volavsek

Inicialmente publicado no site imissio.net

São muitas as passagens do Evangelho que me obrigam a fazer silêncio e a parar. São muitas mesmo, para não dizer todas. Algumas pela densidade teológica, como por exemplo, muitas passagens em S. João. Outras, pela clareza da limpidez de Jesus diante da humanidade. E umas poucas por implicarem uma reviravolta de entranhas, na dificuldade do que é pedido. "Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem", é destas últimas, que ainda mais caracteriza algo muito específico do cristianismo.

Aqui damos de frente com o cúmulo do Amor de Deus. A aparente impossibilidade é logo desmascarada com a simplicidade do “faz nascer o sol sobre bons e maus e chover sobre os justos e injustos”. Estamos perante o Pai que não selecciona pessoas para a sua dádiva de amor. Isto baralha. De instinto, ante os inimigos, parece que é natural e justificado deixar o ódio desenvolver, tentando eliminá-los. No entanto, a humanização em caminho de divinização, implica ultrapassar o instinto. “Apesar de tudo, quero que o outro, mesmo sendo meu inimigo, seja”, seria, parafraseando Gabriel Marcel, uma definição de amor.

Entende-se que o amor visto desta forma não é lamechice pegada, de beijinhos e abracinhos, como se, de repente, tivesse de tornar os meus inimigos como melhores amigos. Isto seria ridicularizar o embate forte de tudo isto. “Amar os inimigos” implica entranhar-me, a partir dessa oração que Sto. Inácio de Loiola nos convida a fazer nos Exercícios Espirituais, de ter e viver o conhecimento interno de Jesus para mais o amar e seguir. Então, apercebemo-nos que, por exemplo, em S. João, Jesus não se cala diante da injustiça e dos seu inimigos, revelando o amor a partir do questionamento. Quando leva a bofetada replica, não em violência, mas na questão que aponta à reflexão e conversão: “Se falei mal, mostra onde; mas, se falei bem, porque me bates?” Diante desta cena, imagino o diálogo a continuar: “O que te leva a bater-me, ainda mais quando tens capacidade para pensar e reflectir por ti? Queres estar submisso à tua aparente valentia de poder? Ou simplesmente imitas o caminho mais fácil, quando os poderes político e religioso são postos em causa ao se mostrar a dignidade de todos, em especial os excluídos e oprimidos?”

Pois, os mandamentos resumidos deixam de ter cargas morais, para se alicerçarem em existência relacional a partir do Amor: “Amai os inimigos”; “amai-vos uns aos outros como eu vos amei”; “amai ao próximo como [se amam] a vós mesmos”. Isto não é simplismo, é densidade no caminho de compreensão de amor próprio (e tanto que falta no mundo) e do amor de Deus, nessa relação com o próximo (que nos remete à parábola do Samaritano). Por isso, a reviravolta de entranhas, muito ligada ao sentido da compaixão, faz como que o caminho de conversão implique o amor à luz e à sombra pessoais, nesse admitir com o mais verdade e coragem possíveis que tanto posso ser perseguido como perseguidor. Se desejo essa aproximação a Jesus, farei os possíveis para atrever-me a entrar, com Ele, na minha escuridão e aí levar a Sua luz. Esse exercício de conversão, podendo ser doloroso, é libertador… permitindo ver que nem o sol, nem a chuva, são do meu domínio, deixando, assim, o julgamento para Deus que simplesmente Ama. E isto, apesar de difícil de compreender, revela o Senhor da Vida.

terça-feira, 14 de junho de 2016

Cores | Sentido(s) | Fé




Claudio Ceriali


[Secção outros tons - especial “dias-de-tanto-a-acontecer”] A fé ganha mais sentido quando o ver, o escutar e o tocar se afastam da multidão. Essa distância necessária, em espaço e tempo interiores, promove saídas da rigidez do preto e branco. As cores, em clareza de luz ou matizadas, mostram o silêncio do muito em cada rosto.

segunda-feira, 13 de junho de 2016

Combater fobias



Leland Bobbé

O grande trabalho é combater os medos, as fobias, em especial as que se dirigem a pessoas. Deixemo-nos de hipocrisia, a maldade pode estar no coração de qualquer um(a), em qualquer grupo social, religioso, político. Por isso, o trabalho é de educar para humanizar… e não são “os outros”, começa por mim. Não interessa atiçar mais ódios, permitindo que uns se tornem mais justificados que outros. Interessa humanizar, pensando que as pessoas são pessoas, para além de características ou crenças. Tendo em conta os recentes acontecimentos em Orlando, lembrei-me deste encontro e conversa que tive há três anos, em Madrid. 

Quando desço a Rua Fuencarral ou a Preciados (centro de Madrid), encontro quase sempre pessoas a pedir sócios ( = €) para ACNUR, Oxfam Internacional, Aldeas Infantiles SOS, Cruz Vermelha, Fundación Josep Carreras, etc. Normalmente, por uma questão de respeito, paro, pois grande parte das vezes aquelas pessoas são votadas ao desprezo de tanta gente. Infelizmente não posso ajudar, o qual explico, depois de dizer que, de alguma forma, também contribuo com a minha própria vida (directa ou indirectamente) em muitas situações que estas instituições também ajudam. Ontem voltei a parar. Desta vez a história é um pouco curiosa. Estavam 4 travestis a pedir para uma Associação de ajuda a pessoas com osteogénese imperfeita (também conhecida como doença de ossos de vidro). Com elas estavam duas raparigas que sofriam da doença. Enquanto descia, uma travesti abordou-me:
- Olá “guapo”! Tens um minuto?
- Sim.
Explicou o propósito da recolha de fundos, se queria ser sócio etc. e tal. Respondi-lhe que não poderia ajudar, pois não me iria fazer sócio da associação.
- És italiano?
- Não, sou português.
- Estás cá a trabalhar?
- Não, estudo.
- Posso saber o quê?
- Sim, claro. Estudo Teologia.
E com ar de muito espanto: 
- Não me digas que vais ser padre?
-Sim, vou e já sou diácono.
A sua reacção facial mudou, como se tivesse saído uma máscara, mesmo por detrás de toda a maquilhagem. E já sem voz de festa:
- Não estás a gozar comigo, pois não?
- Porque haveria de o fazer?
- Hmmm, não é suposto uma pessoa como tu parar e falar, por exemplo, comigo. Não estava à espera. 
Soltei uma gargalhada. 
- Oh, mas... porque não? Porque és travesti? Oh... És uma pessoa, que neste momento está a trabalhar por uma causa e já está. 
E desenvolveu-se ali uma conversa de meia dúzia de minutos. Percebi que era uma pessoa em busca da fé. E no final disse-me, ainda com a sua voz natural e de forma sentida:
- Obrigado por teres parado e me escutares. 
- Espero que consigam uma boa recolha. Já costumo rezar pelas pessoas que sofrem, mas esta noite, de forma especial, rezarei pelas que sofrem desta doença de ossos de vidro. 
- Posso pedir-te que rezes também por mim?
- Claro, com gosto. “¡Suerte!” Adeus.
E abana a cabeça, ajeitando os cabelos e voltando a “máscara”:
- Adeus “guapetón”... ai, desculpa a minha falta de respeito! 
Deu uma gargalhada artística. Eu dei outra e segui caminho. 

De facto, o possível título deste acontecimento é mesmo: “Actos dos Apóstolos 10, 34”, ou seja: “Pedro tomou a palavra: ‘Verdadeiramente compreendo que Deus não faz acepção de pessoas’”

Contra a violência




Eric Smith


[Secção desabafos] Já é tarde, mas estou mesmo com os pensamentos em grande velocidade após leituras sobre o atentado em Orlando. Além do choque de mais mortes, fica a dor de se acrescentar a dose de homofobia que provocou o próprio atentado. O Deus no qual acredito chora estas mortes, tal como chora todas as outras em ataques vis à dignidade humana, envergonhando-se de toda a atitude que descrimina seja quem for, independentemente da raça, religião, género ou orientação sexual. Nos últimos tempos, sempre que há um ataque terrorista, faço um pequeno exame de consciência para ver onde possa habitar algo de ódio em mim, de modo a eliminá-lo. Afinal, como pessoa e, em especial, como padre, não quero partilhar os mesmos sentimentos com terroristas, violadores e homofóbicos.

quinta-feira, 9 de junho de 2016

Corpo




Jean-Louis Fernandez

A propósito do Bgreen // Ecological Film Festival (com a grande Grande Gala bgreen // ecological film festival 2016 esta noite), temos a visita de alunos e professores de escolas europeias. Ontem orientei um pequeno workshop de corpo para um grupo destes alunos. E mais uma vez surge a surpresa das potencialidades nesse conhecermo-nos como corpo que somos. Os bloqueios mentais, que também levam ao moralismo excessivo, diminuem a consciência da dignidade pessoal. Surge o medo do corpo próprio, dos olhares de comparação, dos julgamentos diante do (aparente) ridículo. Surge a vergonha de quem se é. E depois, as pequenas ferramentas para libertar-me, aos poucos, de tudo isso, dando força à dignidade de ser. Tomar consciência e viver as potencialidades do ser corpo em relação é fascinante… e libertador.   

quarta-feira, 8 de junho de 2016

Surpresas



[Coisas que aparecem de surpresa] A propósito do post anterior, a Isabel Bastos comentou que ouviu o Professor Júlio Machado Vaz, em conversa com Inês Meneses, a referir-se à minha pessoa no “Amor é…”, programa da Antena 1. Estive a ouvir. Comentam um poema de Chico Buarque. Por volta dos 22 min e 30 seg surge o tema da religião e eis que menciona o nosso encontro na sala de maquilhagem da RTP, antes de entrarmos em directo n’A Praça. O encontro e o programa já foram há uns meses. É muito agradável ser referido como um exemplo de mudança, ainda mais num programa com Amor no título e a falar de Chico Buarque. ;) Muito obrigado, Isabel! :)


terça-feira, 7 de junho de 2016

Ser conhecido e pipocas




[Coisas do quotidiano da vida de um padre numa escola com grande diversidade de pessoas] Elogio desta tarde, vindo de um aluno do 8.º ano: “O padre Paulo é mais conhecido que as pipocas!” Gargalhada. “Porque diz isso?” “Fala a toda a gente e toda a gente lhe fala.” E é isto. ;)

segunda-feira, 6 de junho de 2016

Mulheres | Violência | Respeito




Tatiana Sharapova


Talvez já tenha caído em esquecimento, por ter sido “lá longe”, mas continua a revolver-me entranhas saber da violação de uma mulher por tantos homens e ainda terem publicado imagens de toda a cena. Fez-me lembrar os tempos de criança/adolescente, em que para se ser “macho”, provando virilidade, havia que apalpar as raparigas, levantar-lhes as saias, etc. e tal. Fazia-me confusão isso tudo. Não tenho irmãs de sangue, mas já imaginava o sofrimento que poderia causar à Suzanne e à Letinha, minhas irmãs de coração. Tantas vezes fui apelidado de maricas, por recusar-me a esses gestos de “macheza”. Afinal, quantas mais são violadas em cada dia, por esse mundo fora, por questões dessa estúpida demonstração de virilidade, de guerra, de raça, de pobreza, “porque sim”, por estranhos ou pelo próprio namorado, marido, companheiro, onde o problema é quase sempre visto a partir delas? Li muita indignação com o acto, junto com o comentário igualmente presente “também ela devia estar a pedi-las”. As leituras deste domingo falaram de viúvas que perderam os filhos. Além da dor da perda, indescritível, estas mulheres retratadas tanto no Livro dos Reis, como no Evangelho, são símbolo de todas as que são socialmente rejeitadas e renegadas. As tais mulheres desgraçadas e apontadas como inúteis ou passíveis de serem violadas. Jesus travou esse abuso. Tanto os homens (pelo que se tem visto, talvez sobretudo os homens), como as mulheres, deveriam crescer e formar-se no fundamento: a educação para a dignidade e o respeito, próprio e de outrem.

domingo, 5 de junho de 2016

Pensamentos soltos, depois de dias de muito.




Mel Kevin Jumangit


[Secção pensamentos soltos: questões de fé, ódio, perdão e vida] Estes últimos dias foram muito cheios. 5.ª e 6.ª, visita de estudo com o 5.º ano a Lisboa (todos ao rubro e eléctricos, parecendo milhares, muitos milhares). ;) Ontem, casamento luso-belga em Óbidos, onde voltei a dar asas ao “franciú”. ;) Depois, Baile de Finalistas, com muito glamour e emoção e recordações. Hoje, celebrei uma Missa de manhã e celebrarei mais duas durante a tarde. Assim, nestes dias, durante as viagens, estando com tantas pessoas diferentes, com mais ou menos fé em Deus, e enquanto preparava as homilias, pensei no bem e no mal que nós, gente de Igreja, em especial padres, podemos fazer. De onde é que este pensamento vem? Por um lado, muitas pessoas vieram agradecer-me as celebrações, algumas comentando que estavam afastadas da Igreja e o porquê, por outro, entre leituras de artigos de opinião, posts, conversas, apercebo-me de muita gente ferida na relação com Deus. O ódio, o rancor, o ressabiamento, mais ou menos disfarçados, impressionam-me sempre e levam-me a pedir perdão, de coração, a Deus pelo mal que nós possamos ter feito em todas estas pessoas. Fazemos muito, mas muito bem, no entanto, parece que uma má palavra, um gesto de recriminação, condenação, exclusão, eventualmente num dia menos simpático, além de ter um eco mais forte, pode abrir feridas imensas no coração de tantas pessoas, acabando por deixar crescer ódio visceral à Igreja, aos padres, até a Deus. Rezo muitas vezes a Missa da reconciliação, também por viver a vocação de construir pontes, sendo alguém a ajudar a que a Paz seja cada vez mais possível neste mundo. Afinal, é impressionante a quantidade de mal-entendidos que impedem o bom diálogo e a compreensão das diferentes partes. Peço muitas vezes a Deus que me ajude a estar atento ao meu sentir, aos meus gestos e palavras, de modo a que a minha acção, ainda mais como padre, possa ser como Jesus, também nessa referência ao profeta Elias, que se compadece, faz parar os caixões e liberta a escuridão desses ódios, deixando que a Vida tenha a palavra mais forte.

quarta-feira, 1 de junho de 2016

Criança(s)




Pai José, com a Mãe Maria por perto.

Foi engraçado encontrar esta fotografia em que estou vestido de príncipe, com o mar ao fundo. Em criança queria ser Super-Homem, para defender quem estaria desprotegido. No entanto, este ser príncipe, mais do que estar ligado a aristocracia, era pensar que poderia ter outros poderes para ajudar e salvar. Se há coisa que as crianças têm é sonhos, junto com grande capacidade para compreender quando são amadas. Andei pelas salas a agradecer a força de ser criança. Houve uma do 5.º que comentou, com a espontaneidade própria: “Padre Paulo, hoje vamos ter gelado e pizza para o almoço [foi o almoço surpresa, que rapidamente segredavam uns aos outros o que era, como se fosse a grande descoberta do mundo ;) ]. Pena é que aqueles meninos refugiados que chegam de longe não possam comer connosco. Eu partilhava com um o meu gelado.” Dei-lhe um sorriso e agradeci o coração que vai ganhando honra e sentido de justiça pelos que mais sofrem… também ao jeito dos príncipes dos contos de fadas.