sexta-feira, 29 de maio de 2020

I can't breathe



[Secção pensamentos soltos com letras verdes] Quando começam a circular vídeos de violência não tenho qualquer tentação de ver. Mesmo que sejam a apelar à justiça. Não significa desinteresse, simplesmente escolho não o fazer. Desta vez foi diferente. Ainda sem ter visto, ecoava-me na oração o “I can’t breathe” [“Não consigo respirar!”] de George Floyd, enquanto as lágrimas saiam. Como agora, ao escrever. Sim, desta vez tinha de ver. Não pelo masoquismo, mas na empatia de saber que tristemente, como pertencente à humanidade, também deixei de respirar, acabando por morrer. Não se é o mesmo depois da morte. Não se é o mesmo depois da morte por violência. Não se é o mesmo depois da morte por violência à mão de quem nos deve proteger… seja polícia, pai, mãe, irmão, irmão, filho, filha namorado, namorada, marido, mulher.

Ao mundo falta respiração, em consciência do alento que transforma o instinto em  cuidado do outro. A profundidade que nos leva a atravessar as sombras do pior de nós, deixando transformar em humanidade. Esta violência tem gerado mais violência. É compreensível pelo emotivismo vigente, contudo têm de haver passos concretos de se encontrar a Paz. É fácil apontar o dedo, dizendo que o problema é do outro. Tremendamente mais difícil é fazer a travessia do deserto enfrentando o nosso lado escuro. Atenção, não desculpabilizo para nada nenhum agressor. Tem de haver a condenação dos actos, para além do simples despedimento. Que se faça justiça, da que não alimenta mais violência. Para isso, recordo algumas palavras de Martin Luther King do seu “I have a dream”: 

“Há algo, porém, que devo dizer ao meu povo, que se encontra no caloroso limiar que conduz ao palácio da justiça: no processo de ganhar o nosso legítimo lugar não devemos ser culpados de actos errados. Não tentemos satisfazer a sede de liberdade bebendo da taça da amargura e do ódio. Devemos sempre conduzir a nossa luta no nível elevado da dignidade e disciplina. (…) Não podemos caminhar sozinhos.”

Que nenhuma morte justifique mais mortes. Que esta morte seja viragem para a consciência do fim de todas as fobias humanas, permitindo que todos possamos respirar digna e livremente.

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