sexta-feira, 15 de novembro de 2019

antes, anterior, prévio




[Secção divagações, em tarde de sexta-feira, a ver uma fotografia antiga, de escova na mão e saco de compras atrás] Uma das coisas que tenho aprendido: diante dos acontecimentos, fazer perguntas sobre o antes, o anterior, o prévio. Não é necessário voltar o big-bang, basta ir ao génesis de cada uma das nossas vidas. Sem julgar. Apenas constatar. Muitas vezes contamos a história por blocos, como se não houvessem subtilezas intermédias que, uma após outra, levaram e levam a algo maior. Palavras, olhares, silêncios, acomodações, feitios, emoções, muitas emoções, grande parte desconhecidas ou abafadas pelo desconhecimento, abraços de pele, cumprimentos cordiais, ironias, sarcasmos, felicidade de reencontro, sons, músicas, quente de sol e frio de mar, medo e medos, realizações, vitórias, desalentos e inspirações ante oportunidades, os cheiros de pão quente ou roupa estendida ao vento da montanha, as orações de amanhecer, o beijo dado e aquele que ficou pendurado na memória, o luto ou a desilusão da relação supostamente eterna e daquela pessoa que abriu perspectivas, as paisagens das viagens feitas ou sonhadas.  Conforme o contexto, nada é ridículo, tornando-se pincelada de vida. Tenho perguntado sobre o antes, o anterior, o prévio, em especial do que leva a fazer mal. Que zanga estará por detrás de alguém que destrói ostensivamente imagens religiosas? Que fobia é prévia ao escárnio a alguém que apenas quer ser feliz a amar uma pessoa do mesmo sexo? Que falta de amor terá tido quem ostenta agressividade nos gestos e nas palavras? Que dor ou luto mal vivido está em quem se refugia no sarcasmo ou autoritarismo como modo de relação? As prisões do antes, do anterior, do prévio, podem explicar muito do agir desordenado. Visitá-las, com tempo e honestidade, é caminho exigente e necessário de perdão. 

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