domingo, 9 de outubro de 2016

Corpo que celebra




Michael Pappas - Cavaleiro numa procissão em honra de Santa Ágata


[Secção coisas de corpo] Nestes últimos fins-de-semana vivi um rodopio de celebrações em diferentes comunidades, em locais e contextos (missas de domingo, casamentos, baptizados e funerais). Estando no altar, vou observando os rostos, os ombros e os braços de quem tenho diante e encontro muitos em tensão. Tanto braço cruzado em posição de defesa… e às vezes pergunto-me: “defender-se-á de si ou do que Deus tem para si?” Também penso na forma como o corpo foi esquecido nas nossas celebrações, pelo menos nesta cultura mais ocidental. Levantar, sentar, ajoelhar é o registo básico e mínimo, como se a única coisa a elevar fosse o espírito, o interior. Pois, o resto do Ser também celebra. Não tem nada que ver com folclore dentro da missa, mas tomar consciência de como, enquanto corpo que somos, há outro “falar” durante as celebrações. Encontro demasiadas pessoas tensas, contraídas. As mais descontraídas, com liberdade de movimento e naturalidade, são as crianças. Podemos educá-las para estar na missa, mas, ainda assim, é tudo demasiado forçado se for explicado “porque sempre foi assim”. Cai-se no perigo de dignidade ou compostura igual a rigidez. O temor de Deus, o respeito, passou a medo. Havendo medo, há necessidade de defesa. Como se, na Missa, para mostrar respeito, fosse obrigatório estar-se tenso. Estando-se em tensão, mesmo que a graça de Deus queira entrar, fica, devido ao bloqueio, mais uma vez à porta. Uma vez , alguém me comentou que lhe chamava a atenção, achando interessante, nunca ter-me visto de mãos postas ou cruzadas durante a missa. É por isto: para estar aberto, disponível, sem cruzamentos, a receber tanto o que a comunidade me está a transmitir, como, e sobretudo, as graças que Deus me quer dar ou confiar. A Diana, minha professora de dança em Paris, das muitas coisas que me ensinou foi a força da presença, onde, em palco (ou, acrescento eu, em celebração), estamos disponíveis nesse dar e receber sem bloqueios. Os rituais seriam mais vivos se a rigidez fosse diminuindo. A dignidade da celebração é mais forte com esse sentido de presença, no aqui e agora, diante de Deus. Como tantas vezes digo, por vezes basta uma boa inspiração e expiração e entregar-se. Depois… depois ainda há muito trabalho a fazer: individual e comunitário.

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