A falta de reflexão - por incapacidade, desconhecimento de como se faz, ou ainda por seguimento do caminho mais fácil – leva à formulação de opiniões fracas, pobres, sem sentido e, por vezes, de forma extremamente arrogante, trazendo consigo uma autoridade de quem a sua palavra é a palavra.
Já caí nesse perigo. Não o vou negar e esconder. Assim, também por ter vivido essa realidade, sinto-me autorizado a escrever sobre este tema da autoridade, sem que siga por uma visão autoritarista, numa imposição da minha verdade.
Há tempos em conversa, surgiu o comentário de que Portugal, com o 25 de Abril, tornou-se um país do “novo-riquismo” dos direitos. Após algum tempo de opressão, o cidadão ganhou novos direitos a partir desta data. Não falarei nem comentarei sobre a opressão, pois não me sinto autorizado para tal, já que me faltam conhecimentos, não só teóricos, mas sobretudo vivenciais. No entanto, posso constatar que, de facto, hoje em dia parece que há toda uma lista de direitos adquiridos ao nível da educação, da economia, da política, da religião, da sociedade, em que muitos se arrogam de alegar seus. E fazem-no como se tivessem toda a autoridade.
É verdade que a liberdade (?) de informação veio permitir dar asas a tais alegações. Blogues, redes sociais, comentários nos jornais on-line, são exemplos de como é possível escrever-se o que se quiser, sobre o que e quem quiser, com grande autoridade. Afinal, a famosa (pseudo)liberdade de expressão é um direito, acabando por ficar refugiada na típica frase “eu cá tenho a minha opinião e opiniões não se discutem” (tal como os gostos). Fará isto sentido?
Não sou contra blogues, redes sociais, e afins. Seria incoerente sê-lo e publicar algo nestes mesmo sítios. Agora sou contra a desinformação, a forma como rapidamente se opina, como se manipula o pensamento social a partir da confusão e, sobretudo, da má educação que nos envolve. Muito disto deve-se à agitação que existe ao nível da autoridade, ou falta dela, levando a que todos se arroguem a prontamente adquiri-la, já que a mesma anda nas ruas da amargura (não posso esquecer que, nas últimas eleições, o programa que fez debate nacional foi humorista, onde literalmente se gozou com a cara daqueles que nos governam, no fundo aqueles que são – concorde-se ou não - a figura da autoridade do país. Como ficará a autoridade se se legitima este gozo descarado?).
Como professor tenho-me debatido bastante sobre esta questão na sala de aula; como leitor de jornais ao ler os comentários; como cidadão ao ouvir o que se diz sobre o país; como pessoa ao me aperceber que os valores das relações humanas andam bastante trocados.
Para ter autoridade é preciso que se seja autorizado. Uma pessoa autorizada é aquela que é capaz de agir de modo a que ajude as pessoas que tem diante de si a crescer, a se formar, no fundo aquela que tem carácter. Por exemplo, em democracia, mediante os votos, é dada autorização ao Presidente da República e à Assembleia da República para governarem, pela maioria dos que votaram – supõe-se que com consciência e com confiança (se assim não foi, é outra história).
Um ponto fundamental é que a autoridade implica necessariamente responsabilidade. Eu tenho autoridade dentro da sala de aula, pois existe responsabilidade para com todos os meus alunos ao nível da educação seja do que ensino, seja da conduta ao nível dos valores e atitudes. Eu, enquanto Comissário de Bordo, tinha autoridade dentro do avião, pois tinha a responsabilidade daqueles passageiros, no zelo da segurança e conforto de todos. Enquanto cidadão também tenho autoridade, entre outras coisas, para denunciar as injustiças, pois também sou responsável pela sociedade de que faço parte.
A questão é que para se ter autoridade tem de se ter formação não só teórica, mas também humana. Caso falhe este tipo de formação entramos no campo do autoritarismo, que corresponde a uma imposição de ideias, acções e até mesmo valores, que apenas beneficiam o próprio ou os seus seguidores, única e exclusivamente.
Vejo que actualmente há um autoritarismo encapotado. Basta pensar na Educação, por exemplo. Medidas atrás de medidas que alimentam a irresponsabilidade (provas de recuperação em caso de se atingir o limite de faltas), o facilitismo (do 8.º para o 10.º), a estatística de (pseudo)sucesso. Tudo em nome do desenvolvimento. Também a desautorização dos professores é uma forma de alimentar o autoritarismo não só dos alunos, como dos Encarregados de Educação.
Muito bem, so what?
Estou numa fase de constatar factos, a avaliação tenho-a feito aos poucos. Não é fácil apresentar soluções, pois é uma luta contra um gigante que se chama “individualismo” crescente - “escolhe por ti, vive o que sentes” -, aliado à falta de tempo para estar com os filhos, comprando-os com tudo o que desejam para não os ouvir, dando-lhes razão com medo do trauma provocado pelo não; junta-se ainda a falta de estudo, de leitura, de se ficar pela superficialidade das coisas.
Não estará na altura de darmos mais espaço à humildade? Humildade não é humilhação, é reconhecimento de capacidades e limites. De facto, se erro devo admiti-lo. O individualismo leva ao orgulho. A verdade e a justiça passam pela busca da coerência de vida, não impondo aos outros que vivam com as falhas das minhas decisões e que façam aquilo que não faço.
Para mim, uma das marcas do apogeu da humanização é libertarmo-nos da lei da selva, onde somos capazes de agradecer o que recebemos, de modo a viver em diálogo, promovendo, assim, a vida do meu próximo.
Obrigado pela partilha das tuas reflexões, com as quais concordo. Na verdade, a falta de preparação para o exercício da autoridade democrática, no sentido de racionalmente legitimada, só é possível com uma boa formação de base. Caso contrário, continuaremos a assistir a um país em que - salvaguardadas honrosas excepções - quem tem autoridade tem falta de conhecimentos e de preparação teórico-prática. É esse o húmus de que se nutrem os regimes autoritários. Será que não aprendemos nada com a História?
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