Pedro Villa
[Secção pensamentos soltos sobre corpo] Há dias estive à conversa numa formação de acompanhamento espiritual a decorrer na Argentina. Pediram-me para falar da importância de corpo no acompanhamento. Este tema é fascinante. Cada vez mais se percebe como O Corpo Não Esquece,(uso o título na tradução portuguesa do imenso e importante livro de Bessel Van der Kolk, psiquiatra que dedicou a vida a estudar questões de trauma). Nós somos mais que intelecto e o sentir, mais ou menos consciente, manifesta-se por todo o ser.
Apesar de ser algo transversal a todas as pessoas, desta vez penso particularmente na vida religiosa. O dualismo espiritualista que anula o corpo está infelizmente ainda tão, mas tão presente, que incapacita viver bem a vocação. Cansaços, frustrações, que levam desde a infantilidades à rudeza no trato, mesquinhez, inclusive com violência a vários níveis estão presentes e precisam ser vistos com atenção, para o bem de todos. Acompanhar desde corpo é permitir conhecer desde o todo e permitir que o Espírito habite no concreto, para profundamente libertar e reconciliar. As idealizações e auto-enganos moralistas impedem a presença de Deus. Às vezes é preciso recordar que Deus encarnou, não se idealizou. Assumiu corpo, carne, entranhas, vida em movimento pleno e total.
Na conversa, dizia com humor que precisamos dançar mais. Bem, ou pelo menos saber como habitar o mais plenamente possível a existência no movimento, no sentir de corpo, que permite atravessar todas as sombras, de modo a crescer, a sermos adultos, também na fé, e levar-nos à liberdade do serviço ao outro, tanto na oração e escuta em acompanhamento ou sinais dos tempos, como no cuidar de quem mais sofre. E o reino de Deus ficará mais próximo, onde haverá festa e alegria entre todos e todas os que se atrevem a ser livres e autênticos no amor e no serviço.
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