domingo, 10 de outubro de 2021

Saúde mental


[Secção pensamentos soltos sobre saúde mental] Quanto mais leio, investigo, escuto, rezo sobre corpo, mais me dou conta do imenso que somos, enquanto indivíduos em e na relação, e do tanto nesse imenso que está desconhecido. A pandemia veio abrir muitas portas desse desconhecimento. Causou e causa medo. Rapidamente queremos voltar à normalidade, chamando-lhe até de “nova”. No entanto, desde a fragilidade que também caracteriza o imenso de corpo, somos afogados de perguntas e emoções, desde a informação excessiva de como devemos ser e estar. Esgotam-se ansiolíticos e anti-depressivos, como desejo de voltar rapidamente à normalidade sem ter de enfrentar a exigente peregrinação de sabermos quem somos, em luzes e sombras. O problema: depois do alívio, as sombras tendem a aumentar e abafar o ser. 


A saúde mental ainda é a a face diminuta da saúde global. No entanto, a falta dela, em maior ou menor grau, atinge grande parte da população. Ainda assim, descarta-se com leviandade, não se percebendo depois como “uma pessoa tão boa” tomou decisões marcantes contra si e contra outros. Pois, é fundamental dar-lhe atenção e pedir ajuda. Mas também é primordial que quem toma decisões políticas e profissionais conheça o mundo da interioridade para lá de dinheiro. Cuidar da saúde mental exige tempo, e não é de mês a mês, ou mais. E feito em particular, infelizmente com as condições sociais que temos, é impraticável para milhares de pessoas. 


Apesar da normalidade exterior que se começa a viver, há tremenda anormalidade, desfoque, inquietação interiores. Por isso, tenho para mim que a linha da frente actual terá de ser composta por escutadores. A sombra tem de ser atravessada de luz, no respeito pelo sentir. E muitas vezes a luz não surge de auto-ajuda, mas através de pessoas que se capacitaram para a transmitir, tais como psicanalistas, psicoterapeutas e psiquiatras. Pedir ajuda não é uma limitação, mas o gesto que pode separar a vida da morte da alma. A experiência diz-me que as sombras atravessadas de luz tornam-nos mais humanos. Se respeitarmos a saúde mental, todo ganhamos em corpo imenso e pleno de humanidade.


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