domingo, 17 de maio de 2020

Acolhimento e respeito




[Secção pensamentos soltos sobre homofobia e preconceito, neste dia contra isso] Muitas vezes estamos rodeados de ideias e conceitos que se ficam pelo abstracto do entendimento. Tomar consciência da realidade implica diálogo com o concreto: conhecer pessoas, olhos nos olhos, com as suas “alegrias e esperanças, tristezas e angústias”. Afinal, como começa “Gaudium et Spes” do Vaticano II, “sobretudo as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as mesmas dos discípulos de Cristo.” Os muitos rótulos que se colocam na condição humana, em generalizações precipitadas, promovem divisão, rejeição, anulação, vergastadas, prisão e pena de morte. 

Tenho acrescentado um infelizmente a estes “dias de”, precisamente por ainda haver a necessidade de recordar a importância do respeito humano. Já que está aí, como padre falo deste dia por conhecer o concreto em escutas como: “o meu pai chama-me depravado”; “conta-me o que quiseres menos que és paneleiro”; “eu que sempre tive fé, devo ter um pecado muito grande por ser assim”; “as pessoas da paróquia começaram a olhar-me de lado por o meu filho estar em processo de mudança de sexo”; “durante a terapia de reconversão gritaram-me vezes sem conta a palavra Deus, fazendo-me expurgar culpas”; “eu devo ter feito muito mal para ter um filho e uma filha assim”; “chego a casa tenho de me maquilhar para agradar a minha mãe, fecho-me no quarto e choro por não aguentar mais a mentira de ser e tantas vezes penso não valer a pena viver”. Isto no nosso Portugal. E, em muitos casos, partilhado depois de muito caminho de abertura por perceber que não julgo nenhuma condição de vida.

Como escrevi há dias, a vida de Jesus é convite a atravessar da margem das categorias e rótulos para a do amor. E no contexto religioso ainda há fobias, estranheza, apontar de dedos, a lamentável hipocrisia, que se deveriam começar a dissipar. Como padre, gostaria muito que este dia deixasse de existir, precisamente pelo expandir de acolhimento. Nós, cristãos, ao crescer na maturidade espiritual deveremos ser cada vez mais testemunhas da densidade do “amai-vos uns aos outros como eu vos amei”.

1 comentário:

  1. Gostei muito do que escreveu sobre este tema. E "deveremos ser cada vez mais testemunhas da densidade do “amai-vos uns aos outros como eu vos amei”, sem dúvida. Acho que há muita gente que esquece este mandamento. Manuela

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