terça-feira, 30 de outubro de 2018

Memórias doridas e tempo



Ramiro Torrents

[Secção conversas de corpo e alma] 
- P. Paulo, não quero recordar tanta coisa. Custa muito.
- Mas as memórias, sem que as controle, surgem, despontam.
- Sim, sim, muito. Eu tento distrair-me, buscar outras coisas, mas… elas voltam por vezes com ainda mais força. Como é que posso evitar que isso aconteça? Não quero, foi tudo tão duro.
- Pois, é mesmo atravessar essas recordações, sem as julgar, porque foram o que foram. É assim que evita com elas despontem de forma indesejada. Dando o passo, com respeito, ao seu tempo, sem se violentar, de ir olhando para cada momento. As feridas curam-se tratando com cuidado, muito cuidado. Não se curam a esconder. É certo que escondidas vão dar sinal, com a dor da presença. E se não dermos atenção, pode infectar e vai doer muito mais. Se olharmos para a ferida, com carinho e respeito e aos poucos começarmos a cuidar a dor do mal vai-se transformando aos poucos em dor de cura, até deixar de doer e tornar-se uma memória curada. 
- Ouço-o falar e parece fácil. 
- O caminho, em si, é fácil e simples. Mas fazê-lo é muito atribulado. É preciso tempo e a companhia adequada, que saiba encaminhar, sem julgamento e com sabedoria na escuta. 
- Preciso de tempo. 

- Tome-o, antes de mais, com carinho e respeito por si e por tudo o que viveu. 

1 comentário:

  1. Elvira22:29

    Tantas vezes se vivem dores escondidas sem ninguém para ajudar a cura-las...
    Só o tempo mesmo..

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