sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Onde estás?




Takashi Ishizaki

[Secção pensamentos soltos] Nas minhas orações e pensamentos soltos, surgem algumas vezes ideias sobrepostas entre a visão global das coisas e o pequeno, o do dia-a-dia, do quotidiano. Entre muitas outras coisas, contribuem as conversas, banais, sérias, de confissão ou corredor, como as leituras, de livros, crónicas e afins. Depois, a minha história pessoal no meio disto tudo, com as distintas relações que tenho. Faço silêncio. Muito silêncio. Aliás, desde há tempos que necessito de maior tempo e espaço de silêncio para digerir as informações que vou recebendo. Não é preciso ser grande especialista para perceber que o mundo está em tensão. No entanto, alguma vez deixou de estar? Em conjunto com “Silêncio na era do ruído” de Erling Kagge, estou a ler o “Sapiens - História breve da humanidade” de Yuval Harari. É interessante perceber esse encontro com o individual e o comunitário. Na leitura quase espiritual sobre a importância do silêncio vejo a humanização que nos pode levar ao essencial do amor próprio. Já “Sapiens” desafia-me ao questionamento sobre a ânsia de poder derivada do instinto de sobrevivência animalesca que milhares e milhares de anos depois continua nas entranhas de cada um de nós. A questão: como é que cada um lida com isso? Pois, silêncio, amor próprio e os outros. Hoje mesmo, a propósito da celebração da Imaculada Conceição, a leitura do livro do Génesis apresenta-nos a primeira pergunta de Deus no texto bíblico: “Onde estás?” Ao ler as notícias de política internacional, mas também a saber de mesquinhez e mentes pequenas em ambiente aldeia (que pode ser do tamanho de Portugal), não deixo de ficar pensativo sobre este desejo de encontro divino. Há dias, em conversa, alguém me dizia: “de que serve ir a muitas missas se quem lá vai rejeita-me constantemente?” Não falava da generalização fácil, mas de exemplos concretos. Parece-me que milhares de anos depois dessa intuição de escrita “onde estás?”, a pergunta continua extremamente actual. De tal maneira que a encarnação acaba por ser uma resposta. “Vou ao teu encontro”, quase se ouve Deus dizer em eco à sua própria pergunta. Um problema constante entre nós, pessoas de enorme complexidade, é a falta de encontro, de empatia, de se saber que o outro é e será sempre diferente de mim. Por isso, não tenho o direito em formatá-lo a um determinado modo de agir ou pensar. É a diversidade e a liberdade que cria humanidade, não a uniformidade e a castração de pensamento. A humanidade é igualmente criada por uma comunidade de unidades, ou seja, pessoas com dons distintos postos a render, sem necessidade de provas ou lutas de poder ou de afirmação de identidade. O “faça-se” de Maria é resposta a essa busca de encontro, onde se aclara a consciência de que o divino não busca a opressão, o controlo, a condenação, mas a libertação, a salvação. Milhares e milhares de anos depois, já começa a estar na altura de elevar o ser para além do poder animalesco, onde cada pessoa, ao seu modo, pode dizer “faça-se em mim” caminho de liberdade. Para isso, o silêncio, o amor próprio e aos outros são imprescindíveis.

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