Sebastião Salgado
“Quem é o ser humano?” Esta pergunta atravessa-me a vida desde há muito. Tomei-lhe mais consciência quando estudei filosofia, em especial antropologia filosófica. Sim, já antes me perguntava sobre tanta coisa à volta do humano, quando ficava preso aos programas tipo National Geographic, quando observava as pessoas na rua, sempre tive essa mania, quando andava em busca de mim, para no fundo ajudar os outros. Enfim, quando alimento esse sonho de conhecer todas as pessoas do mundo. “Quem é o ser humano?” Esta pergunta ecoa-me dentro muitas vezes, sem que a formule. Na oração, no silêncio de mim durante a viagem de metro ou passeio, mais uma vez observando rostos. Hoje voltou… e com presença destacada. Fui ver “O Sal da Terra”, um documentário sobre o fotógrafo Sebastião Salgado. As imagens falam, muito, acompanhadas com as descrições do que viveu de alma e de corpo depois de realizar os vários projectos fotográficos. Fotografou a vida e a morte, o planeta, rostos e mãos, o ser humano. “Eu tinha de fotografar para que ficasse registado a capacidade violenta do ser humano”, comentava a propósito de Êxodos. Neste projecto fotografou a imensidão de gente refugiada no Congo, a fome na Etiópia, as marcas do genocídio do Ruanda. “Quando terminei este projecto senti-me doente. Não estava infectado com cólera ou peste. Estava doente de alma.” Regressou à quinta dos pais, onde nasceu, e com a mulher, Lélia, fundaram o Instituto Terra que promove a reflorestação de terras devastadas pela seca. Plantaram mais de um milhão de árvores, de mais de 400 espécies. Dá-se a reconciliação com a fotografia em jeito de cura de alma e surge o projecto Génesis: voltar às origens da criação. “Estava na altura de aprender a fotografar animais.” Mas não só animais, também a simbiose com o ser humano, nessa harmonia que deveria ser a mais natural de todas. Quando saí do cinema, pensei no ser humano, não no vago, nesse abstracto que se dilui na teoria, mas em rostos: dos mais próximos aos mais longínquos, dos que conheço pessoalmente, aos que me são dados pelas imagens reais de alegria e de dor, muitas deles acabadas de receber do documentário. Percebe-se que muito, para não dizer todo o sofrimento cultural resulta do poder desmedido de alguns. Assim continuamos, desde a Ucrânia, aqui ao lado, até aos países árabes um pouco mais longe, sem esquecer a África e América Latina. A corrupção, a mentira, sem vergonha de enganar e exigir os impossíveis a quem não pode dar. Fomentar a morte, biológica (de pessoas e da natureza), cultural, educacional, em nome de interesses económicos e políticos. Invejas e mesquinhices que fazem perder tempo e sentido de vida. “Quem é o ser humano?” Não encontro respostas definitivas… de momento vou tendo esta, também modelada pela fé, com reconhecido toque de ingenuidade: alguém com desejo de ser amado e de amar. Para apurar a resposta, continuo em caminho…
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