Depois de ler o “Lendo os outros III”, li o artigo de opinião de Mário Soares. E ressaltou-me o título que escolhi: Ironia da Vida. Não percebo como é que um presidente da Comissão para a Liberdade Religiosa pode escrever tal opinião. Rapidamente pode argumentar-se que cada um tem a opinião que quer. Ao que digo: sim, até certo ponto. Até certo ponto, porque dependendo da situação há o condicionamento da função, cargo, que se exerce. Como digo, não me choca nada que Mário Soares, em seu nome, estando desvinculado desta Comissão, apresentasse a sua opinião, mas exercendo o cargo que ocupa…
Pergunto: o que é ser mais culto e intelectualizado? Esta forma de categorização, como qualquer outra que leve a extremos, acho-a mesmo perigosa. Aplicar-se-á apenas àqueles que têm uma vasta formação académica, com muitos conhecimentos sobre algo específico ou, até mesmo, em várias áreas? É inegável que ter muitos conhecimentos permite o aumento de cultura e intelectualização, mas será a única condição? Outra questão, ainda: será que o ser humano será definido apenas pela sua dimensão intelectual, racional? Inegável também que é um dos aspectos que o permite distinguir dos outros animais. No entanto, também é perigosa a absolutização de apenas uma das dimensões do humano. E não tenho medo de reconhecer, enquanto crente, o perigo da absolutização do ser religioso, ou do não o ser. Resultado: fundamentalismos. Creio que Mário Soares, enquanto presidente desta Comissão deve saber – algo intelectual – estes pormenores, porque não são novos, nem originais.
É um facto que a Revolução Francesa, com os seus princípios de igualdade, fraternidade e liberdade, levou a que a laicidade se instituísse de forma quase radical, primeiramente em França, mas também por outros países da Europa. No entanto, isto não significa que, de repente, acabasse a crença, ou houvesse um esquecimento total do religioso. Lourdes confirma-o, por exemplo – mesmo havendo a possibilidade de se dizer que é apenas o “povo” que lá vai em busca do milagre – será?. Além disso, há grandes filósofos, teólogos, cientistas cultos, intelectualizados e crentes na história francesa. Recordo Paul Ricoeur (cristão de orientação calvinista), Joseph Moingt (cristão de orientação católica), Pierre Teilhard du Chardin (cristão de orientação católica), Emmanuel Lévinas (judeu).
Creio que é preciso cuidado quando se faz determinadas afirmações. Além do mais quando se tem responsabilidades acrescidas, perante o cargo que se ocupa…
Sem comentários:
Enviar um comentário