domingo, 15 de junho de 2008

Igreja e Actualidade - Em resposta a estatísticas...



Duas notícias recentes, ambas com base estatística, sobre Igreja ou ligadas de alguma forma à questão religiosa, fizeram-me pensar. Uma foi publicada no "Expresso" de 7 de Junho, outra no "Público" de 10 de Junho. A do "Expresso" referia-se a uma estatística feita pelo Patriarcado de Lisboa, onde como conclusão se afirmava o decréscimo acentuado de fiéis na Igreja. A do "Público" referia-se a um inquérito feito a portugueses, em que, numa das questões, aproximadamente 90% dos inquiridos afirma que ser português é ser católico.

À partida, nada de novo, quer numa notícia, quer noutra. No entanto, estas notícias levantam-me algumas questões. Antes de mais, qual foi o objectivo do "Expresso" ao apresentar um artigo com destaque de primeira página, através de uma fotografia – um padre a celebrar missa diante de três senhoras –, quando depois é apresentado na segunda metade da página outra grande fotografia de alguém de joelhos em Fátima? O meu primeiro pensamento: será que esta é a realidade concreta da Igreja? Nalguns caso, atrevo-me a dizer que sim… Mas, a Igreja é mais do que isto… E o objectivo do "Expresso" foi dar uma imagem negativa da Igreja? Porquê? Além do mais, uma ou duas semanas antes, na "Única", a propósito da pobreza em Setúbal, entrevistaram D. Manuel Martins – bispo emérito de Setúbal – em que percebi um agradecimento ao que este, em nome da Igreja, fez por aquela região.

Em relação à notícia do "Público": mas o que significa isto, 90% dos inquiridos afirmarem que ser português é ser católico? Para onde é que estes dados nos apontam? O que é pertencer à Igreja Católica? Será simplesmente uma forma de seguimento de uma tradição, ou uma convicção consciente de compromisso diante da Igreja? De facto, conforme o questionamento que se coloca perante este dado, podemos ver nele vários sentidos. Se pensar de forma mais pessimista, tendo a notícia do "Expresso" como pano de fundo, vejo aqui mais uma questão de tradição, do que propriamente um sentido de pertença ou compromisso. Se pensar de forma mais optimista, afinal há mais crentes, pelo menos em Portugal – e no resto do mundo também – do que se pensa…

Expostos os factos, ainda assim, creio que a questão não fica rapidamente arrumada. Quer de um lado quer de outro, encontro alguma razão de ser. Ou seja, não é novidade que a Igreja, sobretudo a Igreja portuguesa, tem de (re)pensar o seu modo de estar no mundo. Basta recordar a mensagem que Bento XVI leu, há pouco mais de 6 meses, aos bispos portugueses, levantava este tipo de questionamentos dentro da própria Igreja. Na altura escrevi um texto – Pensamentos Soltos, no qual aponto o que senti sobre a minha leitura da mensagem de Bento XVI. De facto, nós, Igreja, precisamos escutar os sinais dos tempos, e, como é sabido, são tempos que passam a uma velocidade cada vez mais rápida, com transformações a vários níveis. Como é que se escuta os sinais dos tempos? Escutando as pessoas, o que de fundo são os seus anseios, dúvidas e inquietações. Talvez nos dias de hoje as inquietações das pessoas já não sejam se vão parar ao inferno ou não, mas, do que me apercebo, se, já nesta vida, são acolhidas enquanto pessoas que são e não diluídas numa sociedade como objectos de comércio e de consumo. Onde a rotina, a diluição na sociedade, ganha espaço a uma vida com sentido.

Como exemplo, dou por mim a pensar sobre "O Código Da Vinci" e livros semelhantes – Mais do que ser(em) bom(ns) ou mau(s) romance(s), até mesmo nas questões teológicas, o que poderá significar a quantidade de livros vendidos? Será que as pessoas não estão à procura de um Jesus mais humano? Bem, não é que o que eu conheço e com o qual me identifico não o seja, mas na verdade não se pode esquecer que durante muitos séculos as imagens de Deus e de Jesus pregadas não foram propriamente das mais famosas. E, sem dúvida, hoje estamos a sofrer as consequências desse tremor incutido, de uma má catequese, de uma má formação, até mesmo de um clericalismo que elevou os padres, colocando-os num tipo de pedestal de que Jesus sempre se afastou. Recentemente, o Cardeal Martini, apontou alguns pecados da Igreja, nomeadamente a inveja, o carreirismo e, nalgumas situações, a vontade de poder.

Tenho a noção de que estou a ser um pouco forte ao apontar estas críticas, mas está na altura de perdermos o medo de reconhecer as nossas fraquezas. Enquanto humanos somos frágeis. Em cada Domingo no Credo, afirmamos crer na Igreja Santa e Pecadora. Como é sabido, o pedido de perdão, por parte dos Papas, às falhas da Igreja foi bastante valorizado.

Onde é que, nós Igreja, marcamos a diferença? No acolhimento, na escuta, no respeito, no diálogo, mas também pela denúncia da injustiça, seja ela qual for. Mais uma vez, olhando para Jesus, ele agarrou a Sua tradição, não teve medo, denunciou a injustiça – fosse ela qual fosse – acabando por revolucionar a condição humana, sobretudo dos mais fracos, marginalizados e oprimidos, dando-lhe um outro sentido, o da divindade. Como afirma, González Faus, "Jesus não veio pregar uma doutrina, mas veio Viver". Ou seja, Jesus, enquanto verdadeiro Homem escutou atentamente a humanidade, aprendendo a vivê-la, como qualquer um de nós e, como verdadeiro Deus, na sua profunda relação com o Pai, Ele nunca se deixou levar pela mentira, pela corrupção, pela falsidade – fossem elas políticas ou religiosas – denunciando sempre o que impedia que qualquer ser humano pudesse ser "um com Ele, como Ele o é com o Pai", formando assim o Seu Corpo, a Igreja.


Sem comentários:

Enviar um comentário