quinta-feira, 28 de abril de 2016

Ser ponte




“Mais do que construir pontes, somos chamados a ser nós mesmos pontes.” Foi uma das muito boas ideias que ouvi hoje. Faz sentido quando se pensa na complexidade do processo de integração de pessoas que chegam até nós vindas de cenários de guerra. Afinal, a integração implica muita reciprocidade. No acolhimento, não só se dá, também há muito a receber... e há que estar disponível para isso mesmo. Num workshop sobre formação em justiça social falou-se da importância da libertação de estereótipos e etiquetas. O básico: as pessoas são pessoas para além das suas características. Terminámos o dia com uma ida ao centro de Bruxelas. Passámos, obrigatoriamente, pela Praça da Bolsa… onde se concentra a homenagem às vítimas dos recentes atentados nesta cidade. 

quarta-feira, 27 de abril de 2016

Formação




Cheguei há pouco a Bruxelas. Participo num Seminário sobre a integração de migrantes e refugiados nas escolas da Companhia, organizado em conjunto pelo JRS - Internacional e pelo Comité Europeu Jesuíta para o Ensino Primário e Secundário. Somos um grupo de 30 participantes de toda a Europa. E assim avançamos em formação sobre esta realidade dos refugiados cada vez mais presente… à qual somos chamados a acolher e a ajudar. 

terça-feira, 26 de abril de 2016

"Vou renovar todas as coisas"




Ana Beatriz Ribeiro


Fiquei com o “vou renovar todas as coisas”, lido na Missa deste domingo, a passear pelo pensamento. Como é que acontece esta renovação de tudo? A história mostra-nos como há momentos cíclicos e parece-me que esta fase que atravessamos lateja por renovação. De algum modo é incómodo, estranho, onde a incerteza diante de tanto aumenta a sensação de não se ter chão, tendo em conta a velocidade das mudanças. Atravessar a escuridão é necessário, pondo em causa caminhos antigos e encontrar novas perspectivas de encontro à humanização. É caminho de amor, que implica enfrentar a sombra da alma. Por outras palavras, enfrentar os medos, as culpas impostas, a vergonha instalada, que levaram a que se abafasse a natureza a que cada qual é chamado. Daí que a fé esteja ligada de forma bastante forte ao amor próprio, infelizmente em grande quebra. Dá que pensar as imensas formas de chamar a atenção, nesse desejo de se ser amado. Como não creio num deus paternalista, vejo este “renovar todas as coisas” como libertação de formas de viver a fé que infantilizam. O mais fácil é cumprir regras. O mais difícil e exigente é saber questionar-se, amando(-se) e não quer ficar por aí.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

Liberdade




Xinhus/Reuters

Hoje representei a escola onde trabalho nas comemorações do 25 de Abril. Ouvi muitos discursos, de todas as cores políticas, onde se repetiu “liberdade” à exaustão. Perguntei-me: o que é a liberdade?

Será liberdade fazer-se o que se quer? Não me parece. Inevitavelmente haverá colisão de liberdades. Será o que acaba quando começa a de outra pessoa? Também considero uma resposta pouco completa, por ficarmos como que em “guetos” relacionais, onde se vive liberdade apenas em zonas de fronteira.

A meu ver, a liberdade acontece quando, em diálogo e reflexão, duas ou mais pessoas, mesmo tendo pensamentos diferentes sobre a realidade, fazem caminho lado a lado, promovendo, assim, o crescimento pessoal, seu e de todos os que as rodeiam.

Com a situação das escolas com contrato de associação vejo um Estado que caminha sozinho, segundo os seus interesses, tomando decisões que anulam a liberdade da pessoa, em vários níveis. Ironicamente, em nome da Liberdade e da Justiça. Não se porá em causa a liberdade em ter de se ir obrigatoriamente para uma escola concreta definida pelo Estado, perdendo-se a possibilidade de escolha, independentemente das condições financeiras e académicas das famílias, por outra que ofereça um projecto pedagógico que promova a liberdade de pensamento, de religião, de cultura e, inclusive, de ideologia?


Sim, que se recorde a força da liberdade, em tudo, a partir do diálogo, da reflexão, da colaboração e do reconhecimento do bem que se faz.

domingo, 24 de abril de 2016

A dúvida da criança




Aaron Huey

No final da Missa, uma criança aproxima-se:
- P. Paulo, porque é que fecha os olhos tantas vezes durante a Missa? Está a dormir? 
[Gargalhada minha]
- Sim, aproveito e faço pequenas sestas. Não sabias?
- Mas como é que consegue dormir e manter-se direitinho? É que às vezes está de pé.
[Outra gargalhada]
- Vá, eu conto a verdade. Fecha os olhos e sente a respiração. Só isso. Como te sentes?
- A acalmar.
- Agora imagina que alguém muito especial está a abraçar-te. [Surge um sorriso suave] Então?
- É bom.
- Por ser padre, nalguns momentos tenho de falar de forma especial em nome de Jesus, então, por ser grande a responsabilidade, eu fecho os olhos, e, ora estou à escuta, ora agradeço a presença dele na minha vida. Depois, imagino-o a dar-me um abraço e a dizer-me: ama. E é isso mesmo: é bom, por isso faço-o muitas vezes. Tu também podes fazer.
- Mas eu não vou falar em nome de Jesus.
- Pois, na Missa, como eu, não vais, tens razão. Mas, na vida, no dia-a-dia, quando acreditamos em Jesus, os nossos gestos de carinho e amizade falam muito dele. Por isso é que, sempre que quisermos, podemos fechar os olhos e imaginar o abraço de Jesus. E assim estamos também a rezar. 
- AHHH, [com grande sorriso], descobri!! O P. Paulo, passa a Missa a rezar! No próximo domingo também vou fechar os olhos.

sexta-feira, 22 de abril de 2016

Conferência em Leiria




Esta noite vou estar no Seminário de Leiria a partilhar alguns pensamentos e reflexões sobre isto de “O uso de uma fé credível (e o que tem a misericórdia a ver com isto)”. Como se vive a fé, ainda mais credível, que passa pelo amor próprio que se dirige ao amor ao próximo a partir da misericórdia? :) 


quinta-feira, 21 de abril de 2016

Educação: tema complexo




Teresa Lamas Serra


A educação é tema complexo... e, tal como o ser humano, nunca assenta em neutralidade. A nós, jesuítas, sempre nos apaixonou desde cedo. Inácio de Loiola apercebeu-se da riqueza que era formar pessoas, dando-lhes valor e dignidade pela aprendizagem em "letras e virtude". Começaram a surgir os colégios por toda a Europa e, pouco depois, por todo o mundo. Portugal também teve os seus tantos, até à expulsão promovida pelo Marquês de Pombal. Muitos, para além das capacidades financeiras, aprendiam e aprendem a partir da nossa pedagogia, que ainda hoje é referência no ensino. Afinal, conduz a que a pessoa desenvolva e explore os seus talentos, com liberdade de pensamento e religião... tendo isso muito que se lhe diga. Coisa que parece difícil de entender por parte de um governo que quer anular qualquer possibilidade de liberdade, também no ensino. A questão não é financeira, é ideológica. Sabe-se que tudo o que seja religioso é alvo a abater. Já o anunciaram, de forma velada, sem escuta de qualquer parte interessada a não ser eles próprios. O Colégio das Caldinhas, onde trabalho, e o CAIC, onde já trabalhei, além de prestarem serviço público, são colégios de gente rica, não pela questão financeira como muitos argumentam erradamente, mas de educadores (docentes, não-docentes, mães e pais) que acompanharam e querem continuar a acompanhar os milhares de alunos com mais ou menos dificuldades (sejam de que tipo for) a crescer em "letras e virtudes", junto com a liberdade... de vida, de pensamento, de espírito.

terça-feira, 19 de abril de 2016

Basta acreditar




Olinda Morgado

A Suzanne ligou-me de 2.ª vez depois de um telefonema rápido. “Senti a tua voz estranha. Estás bem?” “Sim, de mim, estou! Mas tenho estado a ler sobre o Equador e sobre o Brasil, a visita do Papa a Lesbos, encontrando-se com os refugiados. Também a rezar um pouco sobre situações de vida que acompanho. Enfim, estava em pensamentos soltos sobre humanidade.” E foi, ontem deitei-me assim com aperto no coração. Dá tudo tanto que pensar. Ando bem, com imensa vontade de dar vida. Apenas há dias, com todos estes acontecimentos, em que sinto esta transformação de mundo de forma mais intensa. Acordei, aulas… fui ter com a minha direcção de turma, dar-lhes sorrisos e, qual mantra, “amigos, já sabem, brio profissional!” No regresso ao gabinete, há alguém que se aproxima e “stôr, obrigado por acreditar em nós”. Seguiu caminho. Eu entrei e agradeci… o quanto podemos humanizar. Tantas vezes basta acreditar. É o que lhes digo.

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Que andamos aqui a fazer?




Fábio Teixeira

[Secção desabafos, com texto modificado de outro de há dois anos. Lembrei-me dele por, além de continuar a fazer sentido, estar a reviver o mesmo sentimento de confusão diante dos acontecimentos do mundo.] 


[Suspiro] Daqueles profundos, depois de pensar: “Que andamos aqui a fazer?”. Que ando aqui a fazer? Não, não se limita à pergunta existencial, filosoficamente talhada para um ensaio ou registo de argumentos políticos. “Que andamos aqui a fazer?” é das perguntas que exigem reflexão por carregar nuances de muitos acontecimentos que cada pessoa vive. E que o mundo vive. É difícil, muito difícil, pensar e viver o justo nos tempos que correm. Na era da informação, onde tudo se sabe, instala-se o “está mal, porque não me dá jeito”, entrando ou pela opinião "porque-sim" ou pela crítica fácil… onde a Memória vai-se desvanecendo para o canto sombrio da existência. Dói estudar História, Sociologia, Antropologia, Filosofia, Literatura e, sim, Teologia, adquirindo a gramática ou o esqueleto da reflexão. O Comunismo fez mal, o Socialismo fez mal, a Monarquia fez mal, o Fascismo fez mal, a República fez mal… o poder da falta de Liberdade faz sempre mal. A Liberdade constrói-se entre perder e ganhar, saindo de si. E é difícil perder. Mais que ganhar. Consegue-se democracia onde os que perdem ganham força para denunciar as injustiças dos que ganharam. Se a força tem como base o rancor, o ódio, a ânsia de proveito próprio, apesar da letra mudar dá-se o virar de disco a tocar a mesma música. Se a força tem como base o querer dar Vida ao outro, a partir da colaboração, já não interessa a competição, mas a vontade de que todos, mais que vencedores, sejam. Talvez aí deixe de ser necessário emigrar, fugir, refugiar-se. “Que andamos aqui a fazer?” Da minha parte, a deixar-me “ser do tamanho do meu sonho”. E saindo de ilusões, a ajudar como posso aqueles que me são confiados a ser gente livre, para além da raça, da cor, do sexo, do credo, do dinheiro, da nação.

segunda-feira, 11 de abril de 2016

Pancas




Terra Fondriest


Hoje passei por algumas salas. Pedi licença para entrar, disse-lhes, a alunos e professores, “vocês são espectaculares e esta escola não seria o mesmo sem vocês. Obrigado!” e saía. Ainda deu para ver o ar de surpresa, de “este passou-se” e de “ohhhh”. Sim, tenho estas pancas para mostrar que na escola também se vive e aprende a reconhecer o valor e a humanidade de quem a compõe.


domingo, 10 de abril de 2016

Fé e conversão [ad intra]




Reuters


[Secção desabafos] Cada vez mais vou confirmando que o Jubileu da Misericórdia deve ter como foco principal a própria Igreja no seu interior. De que serve um afirmar de fé, quando a acção de vida passa por julgamento, inveja, condenação e maledicência? O caminho do cristianismo é difícil, não por se buscar puros e capazes de cumprir direitinho para ficar sem manchas de currículos, mas por tentar compreender as entranhas do amor que olha para cada pessoa com imenso cuidado e atenção. Para isso, a tal conversão necessária que cada um de nós é chamado a viver, implica tomar consciência da realidade pessoal e social na sua complexidade, com luzes e sombras, tal como Cristo o fez. De nada serve pregar a fé em Deus, quando no quotidiano a minha acção é contrária ao que prego. Talvez a experiência de ter negado Cristo, de ter sido, de algum modo, o filho pródigo, levou Pedro a perceber a força do “tu amas-me?” por três vezes. Os que estamos dentro da Igreja, se seguimos em certezas de que “somos os melhores” sem consciência das mudanças, corremos sérios riscos de ficar como o filho mais velho da parábola, com o rancor em crescendo que impede de ver a possibilidade de encontros para além da doutrina, nossa ou de outros. Pois, a conversão não é algo que acontece apenas uma vez… vai sendo de vida, até nos tornarmos mais humanos e assim vivermos a força do divino.

terça-feira, 5 de abril de 2016

DT



[Coisas inesperadas do quotidiano numa escola] Fui buscar um pedaço de travessa de barro que guardo desde há 5 anos e meio. Parti-a na minha última aula como director de turma do 9.º C. Nela estava escrita uma oração de Fernando Pessoa, que nos acompanhou ao longo do ano lectivo. Depois de partida, dei um pedaço a cada um e fiquei com este da foto, que fui buscar… e assim avivar a memória do que significa ser DT. Os “meus” meninos e meninas dessa turma já são jovens adultos. Como lhes disse a seu tempo, ensinaram-me muito sobre paternidade espiritual com muito “amôôôôôôr”. ;) Pois, o pedaço de barro aviva a memória, em especial por ter assumido desde ontem a direcção de uma turma. Desta vez um 9.º F. Serão apenas dois meses, mas, além das burocracias (ai a educação que é cada vez mais administrativa, levando o DT a ser quase mais secretário que professor), o mais importante é ajudá-los a crescer. Também aqui se faz e vive pastoral… no tal cuidar, tão necessário, do outro. 

segunda-feira, 4 de abril de 2016

O muito do dia... e do mundo




Melissa Farlow

Hoje muita coisa aconteceu ao longo do dia, neste arranque de período, com novidades e decisões a tomar aqui no Colégio e fora dele. Mais ao final da manhã, quando parei um pouco ao computador, li as notícias sobre as primeiras deportações de refugiados da Grécia para a Turquia e sobre a investigação “panamiana”. Numa primeira reacção, senti revolta a crescer nas entranhas. Valeu-me um álbum que ouvia e descobri por acaso no youtube. O som, nesse momento, fez-me brotar a Esperança, em contraste com a revolta e alguma emoção. Olhei a pequena vela que tenho no gabinete, respirei… fechei os olhos e imaginei a força da honestidade e da coragem em ser-se humano tanto no canto quotidiano, como lá longe, onde tanto se passa. Agradeci a Deus por quem busca a verdade, o sentido de justiça e o respeito pelo outro. O telefone tocou e lá fui encontrar-me com o casal luso-suíço que vou abençoar o casamento. É sempre bom ver brilho de olhar quando lhes digo: “é o vosso dia. Não é dos convidados, dos pais, da família, do padre, é vosso. Por isso, façam tudo para que seja realmente o vosso dia!”



domingo, 3 de abril de 2016

Triste comparação




Ernie Vater


“Não esqueças de que há gente que sofre mais do que tu!” Disseram-me esta terrível frase em tempos que não me estavam a ser propriamente fáceis. Daquelas noites de grande escuridão de alma, em que o sentido das coisas se perde de forma brusca e dolorosa. Não estava em depressão, mas o sentir tocava à porta dessa mancha informe que a tantos rodeia e poucos compreendem. Partilhava o que vivia e lá me disseram “não esqueças de que há gente que sofre mais do que tu!” Não duvido que tenha sido dito com intenção de ajudar a relativizar, mas… mas foi terrível, por ter-me aumentado o sofrimento: além do que estava a passar, acrescia o “sofrer por estar a sofrer”. Se não se sabe o que dizer a alguém que está a passar por maus momentos, uma das grandes obras de misericórdia é o estar em silêncio de escuta atenta e não dizer de todo que há quem sofra mais. Sim, até pode haver, no entanto, o sofrimento, tal como a vida, não deve ser levianamente comparado. Na escuta, como acto de misericórdia, vive-se o respeito pelo sofrimento do outro, para além de todos os demais sofrimentos que possam acontecer no mundo, sendo também caminho para iluminar e aquecer os recantos de um coração sofrido.

sábado, 2 de abril de 2016

Tempo




Filipe Faleiro


[Secção outros tons] Precisava de tempo. Para quê? Saber que amor brotava em mim, quando te vi partir. Dei o tudo por tudo garantido, nessas certezas que esquecem as mudanças. Espero-te. Espero-me. Há travessias a fazer. Por mim. Por ti. Por amor.

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Mentira | Verdade | Autenticidade




Aula com Diana Ringel, em que trabalhámos a verdade e a mentira em corpo.

Parece-me que um dos grandes desafios que temos é o de vivermos cada vez mais na busca da verdade de nós próprios. Por outras palavras, de não nos enganarmos a nós mesmos… que pode ser frequente e subtil, com os sentimentos ou pensamentos. Quando Cristo nos convida a viver a “verdade que nos salva”, não tem que ver com algo puramente intelectual, mas com caminho de autenticidade nas várias dimensões do ser. A verdade de nós pode levar-nos a momentos de dor, de vergonha, de nojo de si. No entanto, quando há coragem para atravessar a sombra, permitimos que a luz tenha a última palavra. A dança, com a oração, ajuda-me muito a encontrar o movimento autêntico, revelador da força que levo dentro.