quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Folha branca




Aula de 3.º ano Ensino Profissional (alunos entre os 17 e os 20 anos). Módulo: Relações humanas e gestão de conflitos. “Uma das coisas que me apercebo é a grande necessidade que há de falar sem filtros. No entanto, é difícil falar de sentimentos e explorar o que nos vai nas entranhas. Já sabem, eu acredito em vocês. Não me interessa os estigmas e preconceitos que há com as pessoas que frequentam estes cursos. Eu acredito em vocês. Aqui têm uma folha branca. Vão escrever o que quiserem… até mesmo ‘estou farto desta m..da toda’. É para vocês, não é para me darem. [Caras de incómodo, estranheza e ‘este passou-se’.] Peço-vos que sejam verdadeiros e autênticos convosco.” Música de fundo. Também escrevi na minha folha. Um silêncio impressionante. Sim, incómodo, muito mesmo. “Stôr, acabei.” Levantou-se e veio dar-me a folha. “Ah, mas não é para me dar.” “Eu quero que leia.” Muitos entregaram-me. Terminei a aula antes do tempo para lhes dar tempo para respirar… “Stôr, não volte a fazer mais disto!” “Ainda agora estamos a começar.” ;)

terça-feira, 27 de outubro de 2015

Agradecido




Enviei este sorriso a uma pessoa especial, depois de ter recebido uma mensagem à qual me senti muito agradecido. Isto há uns tempos. Acho que faz sentido partilhar hoje este sorriso no dia seguinte a ter recebido tanta manifestação de carinho e amizade. Sorri muitas vezes, emocionei-me também, agradeci, agradeci muito a Deus. A vida é feita de relação, de busca, de encontro, de deixar que nesta peregrinação possamos ir abrindo mais os horizontes. Ontem foi um dia cheio… ainda está a ser. Não conseguirei responder às muitas mensagens que recebi. Fica aqui o agradecimento especial, com um sorriso, a cada uma e a cada um. 

terça-feira, 20 de outubro de 2015

Sonhos




Aula com alunos de 5.º ano. Tinha pensado um tema, mas uma pequena conversa de corredor com um pequenote antes de entrar na sala fez-me mudar o que tinha pensado. Sumário: “Ao encontro dos sonhos”. Foi engraçado vê-los agitados de curiosidade a passar o sumário. “Sabem, acredito que os sonhos mudam a vida e que podem realizar-se. Façam o favor de sonhar muito! Que sonhos têm?” E comecei a escrever no quadro os sonhos que iam partilhando. Regras: ninguém podia julgar, nem pôr em causa ou gozar com nenhum sonho de um colega. Era o tempo e espaço de liberdade para partilhar os sonhos. No final, já quase na hora de sair, queriam continuar a partilhar. Disse-lhes: “Mais importante do que partilhar agora, alimentem os sonhos no vosso coração. Libertem a imaginação. Não há sonhos impossíveis. Podem realizar-se de forma diferente ao que esperamos, mas realizam-se.”

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Encontro, conversão.



Sirsendu Gayen


O encontro connosco mesmos, esse entrar na consciência de si, é um exercício exigente. Tenho-me apercebido disto nestes tempos de muita aprendizagem, acabando por surgir muitas perguntas que me fazem tremer diante do que me é confiado. O exterior pode ser desafiante. No entanto, o grande desafio está no transformar-me, converter-me, ampliando o horizonte do meu sentir e estar. E isto é duro, sobretudo por também implicar perder ou perder-me. Pode-se dizer: a exigência da fé nesse abandono à confiança de Deus, que não está lá, como os ídolos, mas cá, nas entranhas, segredando a força da própria humanidade e divindade. A conversão não é para apenas tornar-me uma pessoa melhor, mas alguém divino com Ele. Para tal, as noites, os silêncios, as ausências de Deus fazem crescer, dando-se caminho de liberdade.

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Deus em causa




Calla Kessler

- Stôr, desculpe a pergunta. O stôr na Missa de domingo disse que às vezes não acredita em Deus. Percebi bem? 
- Não me recordo como formulei. Provavelmente o que disse foi, mais do que não acreditar, que também punha Deus em causa. Melhor, questiono o meu modo de acreditar em Deus.
- Nunca pensei que um padre pudesse dizer isso. Se o diz, sinto-me mais descansado.
- Então?
- Oh, acho que também passo por isso, mas fui ensinado que a fé não se põe em causa. 

- Não ponhas em causa a fé em ti, mas quanto ao modo de ver, viver ou sentir Deus, de vez em quando é bom que te perguntes sobre isso. Agora, não o faças sozinho. Busca sempre alguém que te compreenda e ajude a fazer caminho. Deus e nós somos mistério, pena é que se perca a consciência disto. 

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Caminho de sombra...



Takashi Nakagawa


No caminho da liberdade, há vistas de beleza em encantos de consolação. É o brilho de sol em Primavera ou Verão. Vem o silêncio da contemplação. Com igual naturalidade, mudam as estações. O caminho segue e a rota leva até às sombras da alma que repugnam, não apetecendo encarar ou aceitar. Suaviza-se a consolação da beleza, em contraste com a nova visão da realidade que, afinal, também sempre lá esteve. Abraão, Jacob, Job, Jonas, Isaías, a mulher Samaritana à beira do poço, e, claro, Jesus, passaram por esse confronto para encontrar liberdade. Nessa marca de ideais sociais e religiosos de perfeição ou pureza, esconde-se ou evita-se tocar o lado sombrio do ser. Por mais duro e terrível que seja, nessa passagem dá-se crescimento, expansão do ser, em liberdade e amor. Daí que nunca se pode julgar. O caminho com Deus é profundamente pessoal.

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Ensinar. Saborear.




Sho Shibata  


Aula com alunos de 5.º ano. Lemos um poema de Ary dos Santos, onde se percebe que estudar pode significar muitas coisas. No final, propus que em casa voltassem a ler o poema e no caderno escrevessem os versos ou palavras que mais lhes chamassem a atenção. Rapidamente alguns braços no ar para perguntar: “O tpc é obrigatório, professor?” Respondi-lhes: “Não, não é nem tpc, nem obrigatório. É uma proposta para que em casa com mais calma possam saborear o poema. Que pena é que só se façam as coisas quando são obrigatórias. Sim, imagino que têm muito que fazer e limitam-se ao que são obrigados, mas, por favor, não reduzam a vossa vida de estudo ao que é apenas obrigatório.” Não sei quantos irão fazer o que pedi. Sei que nestas idades é preciso marcar bem os limites. No entanto, também sei que as crianças podem ser educadas no sentido da liberdade em saborear a realidade. Há riscos? Sim, há. Mas quero contribuir para uma educação que não mecaniza, mas humaniza. 

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Silêncio




Francisco Negroni

O silêncio faz jus à Palavra.
Nessa escuta, em tempo
que o pão leva a ser amassado,
o vento passa pela vinha

soltando folhas de fogo.